* Por Leo Monte
Você parou para analisar que empresas como Uber, Apple, Google, Amazon e Facebook estão querendo ser um banco? Ou que pelo menos buscam atuar diretamente, seja com parceiros ou não, com serviços financeiros?
A recente cartada foi do Google que vai oferecer um serviço de conta corrente aos seus usuários em 2020. A Apple, em parceria com o banco Goldman Sachs, lançou ano passado o Apple Card, cartão de crédito com bandeira Mastercard. Um dos benefícios do cartão é o cashback.
O Facebook, que no meio do ano passado anunciou sua própria criptomoeda, a Libra, lançou em novembro o Facebook Pay, sistema unificado de pagamento para as plataformas da rede social. A empresa disse que a iniciativa é um projeto à parte da Libra, mas convenhamos que de alguma forma se conecta.
A Uber apresentou recentemente uma nova divisão chamada Uber Money, com foco em serviços financeiros, que oferecem desde cartões de crédito e débito, até carteiras digitais para os motoristas. O recurso está sendo disponibilizado primeiramente para os motoristas nos Estados Unidos, e logo em seguida para os outros países.
Vantagens das gigantes de tecnologia no setor financeiro
A principal delas é possuir uma grande base de usuários em sua plataforma. Por exemplo, o JP Morgan possui 46,7 milhões de clientes digitais, alegando ser o site de banco mais visitado e com mais clientes móvel. Em contrapartida, a Amazon Prime conta com 90 milhões de assinantes nos Estados Unidos. São 90 milhões pagando US$ 99 por ano, com isso a empresa gera quase US$ 9 bilhões em receita sem que esses clientes comprem nada na plataforma. E tem um outro detalhe, sem falar que os aplicativos bancários estão longe de ser os aplicativos mais populares no smartphone.
O fato é que empresas como Amazon e Facebook capturam uma parcela cada vez maior do tempo e da atenção dos consumidores. Essas companhias enxergam pagamentos e serviços financeiros não como um fim, mas como uma ferramenta para aprimorar ainda mais a aderência do cliente e monetizar via publicidade, e-commerce e outros serviços. E quando essas empresas de plataforma investem em pagamentos e finanças, principalmente em mercados emergentes até agora, elas já nascem grandes.
As movimentações do mercado nos últimos anos deixaram claro que as finanças estão sendo reinventadas e recriadas em mercados emergentes pelos grandes players da tecnologia e com a proliferação de plataformas móveis. Além disso, as plataformas de mídia social e comércio eletrônico são capazes de construir uma ponte para o mundo financeiro precisamente por causa dos dados gerados pelos usuários e pela capacidade irrestrita de aplicar as tecnologias mais avançadas para gerar valor a partir desses dados.
Preocupação com a responsabilidade dos dados
Sem dúvida, as companhias de tecnologia consideram os serviços financeiros como um caminho para se aproximar dos usuários e obter dados valiosos. Só que, atenção, à medida que grandes empresas se aprofundam no setor financeiro, surge uma preocupação quando o assunto é a necessidade de regulamentação do setor. Nos próximos meses, sem dúvida, vai gerar reações em Washington, nos Estados Unidos, onde as autoridades regulatórias já estão investigando se as grandes empresas de tecnologia não exercem influência.
Vale lembrar que um acordo entre o Departamento da Justiça e a FTC (Comissão Federal do Comércio, órgão de defesa do consumidor dos EUA) abriu caminho para investigações antitruste sobre Google, Facebook, Amazon e Apple, ainda que não esteja claro se as agências conduzirão inquéritos oficiais ou que grau de agressividade empregarão em suas ações. A FTC realizou diversas audiências sobre a possível necessidade de adaptar as leis antitruste à era da economia digital e neste ano anunciou a formação de um grupo de trabalho sobre tecnologia para estudar a competição no setor.
A Apple irritou seu parceiro no cartão de crédito, o Goldman Sachs Group, ao afirmar em sua publicidade que “o cartão foi concebido pela Apple, não por um banco”. Vale lembrar também que grandes empresas do setor financeiro abandonaram o projeto de criptomoeda do Facebook depois da reação regulatória adversa à ideia. A moeda digital idealizada pela rede social perdeu Visa, Mastercard, eBay, Stripe e Mercado Pago. As empresas abandonaram o plano depois do Paypal deixar o grupo.
Temos um caso delicado com o Google!
A companhia, que já afirmou que não usa dados do Google Play para fins publicitários e que não compartilha esses dados com anunciantes, cada dia que passa terá de convencer um público cada vez mais cauteloso quanto à forma pela qual empresas usam seus dados.
Nesse mundo digital a privacidade é uma questão delicada, mas por outro lado quando utilizada de forma correta se torna uma grande oportunidade para as big techs. É que diferente dos tradicionais bancos, as gigantes da tecnologia tem a possibilidade e facilidade de cruzar seus dados para conhecer o usuário e construir ofertas de produtos financeiros conhecendo o real comportamento do usuário. Sem falar do uso da inteligência artificial que potencializa ainda mais a assertividade e as oportunidades.
A era do exponential banking
Estamos vivendo diariamente uma evolução natural da digitalização na indústria de serviços financeiros, sendo ela própria alimentada pelo crescimento exponencial da tecnologia ao longo dos últimos tempos. Claro que no último ano tivemos uma evolução tecnológica que inclui ainda computação móvel, nuvem, inteligência artificial, Internet das Coisas, realidade virtual e aumentada, e outros campos onde cada vez mais informações estão disponíveis para processamento em velocidades muito maiores.
Esse novo momento deve oferecer oportunidades para a construção de serviços financeiros muito mais eficientes, com capacidade de impulsionar novos modelos. Falarei sobre a era do exponential banking em um novo momento, só quero destacar que ser digital não tem a ver com uso da tecnologia e sim com um novo mindset. Mentalidade essa que os bancos já vêm modificando internamente por entenderem que essa combinação entre tecnologias emergentes e foco no cliente vai ser primordial para o futuro.
2020 promete e vamos acompanhar de perto essa evolução do mercado.
* Leo Monte é CMO da Sinqia e Chief Innovation Officer do Torq, hub de inovação da empresa.