* Por Marcelo Furtado
Os últimos 12 meses empurraram o RH das empresas para uma espécie de digital compulsório. Esse movimento foi causado por vários fatores, como a necessidade de manter grande parte da equipe em trabalho 100% remoto; a mudança da lógica de “ficar de olho no funcionário” para uma de “capacitar a equipe a gerenciar seu tempo” e a requalificação das equipes para lidar com uma sociedade que sairá da crise muito diferente do que entrou.
Neste momento de crise, ficou evidente a importância de mudar. Uma pesquisa realizada pela KPMG sobre o digital nos negócios e a reinvenção do Recursos Humanos mostra que 69% dos executivos entrevistados acreditam que o RH corporativo precisa se reinventar completamente para lidar com os desafios que virão.
Essa pode ser uma grande oportunidade para colocar o Recursos Humanos no centro das discussões estratégicas das empresas. Mas como o RH digital pode ajudar a preparar a empresa para o futuro pós-pandemia e contribuir para o crescimento dos negócios?
A resposta começa em uma mudança de mentalidade do próprio RH, que precisa ir além de funções burocráticas e ser mais propositivo. Com base no entendimento das dificuldades estratégicas do negócio, e utilizando dados para embasar a tomada de decisões, é possível ir além da automação de processos e ocupar “um lugar na mesa” a partir de questões como aumento de performance e desenvolvimento de uma cultura digital para todo o negócio.
O RH solucionador de problemas
Muito tem se visto que o digital nos negócios tem fortalecido alternativas de trabalho, como o home office. Nesse conceito, o trabalho precisa deixar de ser medido pelo cartão de ponto ou por uma pesquisa de clima, para ser avaliado a partir da entrega eficiente de projetos. O resultado muito positivo é levar o profissional de RH a ter uma mentalidade de entregar resultados mensuráveis e, a partir daí, incutir essa visão em toda a companhia.
Em termos práticos, uma mudança completa: o RH deixa de contar as horas extras que cada funcionário realizou e passa a se preocupar com a qualidade do trabalho, com a eficiência nas entregas e com a premiação de quem gera inovações que trazem resultados palpáveis.
Não é uma mudança simples. Para fazer isso, por exemplo, é preciso identificar quais são as dores reais do negócio – o que significa entender quais são as dos clientes. Para medir resultados, é preciso identificar algum problema e estabelecer métrica para acompanhar a solução. Será que se sabe, hoje, identificar quais são os problemas mais importantes para a empresa?
A questão mais importante deixa de ser o cartão de ponto ou a distribuição dos benefícios e passa a ser como fazer a empresa vender mais. É olhar a estratégia e responder aos seus aos desafios.
E como a tecnologia está aí à disposição para automatizar as questões mais operacionais dos negócios, os profissionais de RH passam a ter um perfil muito mais analítico, voltado a testes e aprendizagem, do que executor de rotinas já estabelecidas. Esse novo profissional precisa ser um solucionador de problemas, capaz de trabalhar com grupos diferentes e diversas ferramentas para gerar respostas que transformem o negócio.
Tudo nasce na cultura
Atualmente, o RH tem dois caminhos para resolver problemas. O primeiro, que não é o ideal, é conseguir coletar informações e transmitir esses dados para que outra área entenda como aquilo se encaixa à realidade do negócio. O segundo caminho, que é a melhor opção, faz o RH assumir a responsabilidade por criar hipóteses em cima dessas informações e testar essas ideias até encontrar uma solução para o problema.
Isso exige uma nova mentalidade. Por isso, o digital nos negócios deve começar por uma cultura digital, e não pela digitalização de processos. Essa cultura está baseada em alguns pontos fundamentais para o sucesso das empresas:
– Foco no cliente: uma empresa que não está focada nas necessidades dos clientes se torna irrelevante muito rápido. O RH precisa liderar esse foco, treinando equipes para atuarem dessa forma e identificando pontos de melhoria a partir das questões mais importantes de negócios.
– Proatividade, testes e aprendizados: não adianta esperar que alguém traga o problema pronto para ser resolvido. O ambiente corporativo precisa ser cada vez mais parecido com o de uma startup: ideias, insights sobre as dores dos clientes e hipóteses sobre como resolver. A partir daí, realizar testes dessas hipóteses até encontrar respostas válidas e que possam ser usadas em grande escala. O RH precisa ser ativo na solução de problemas.
– Medir e entregar: só se conquista uma posição estratégica com base em um modelo de pensamento mais analítico. A área de vendas sempre precisou ter essa mentalidade, pois tinha ferramentas para medir o impacto de suas ações no negócio. Hoje o RH também consegue medir. É hora de partir para entregar resultados.
– Abraçar a mudança: o RH sempre viveu em meio a processos bem definidos, rígidos. Não mais. Fazer as coisas do jeito de sempre não garante resultados excepcionais. É preciso repensar os negócios. O RH, com as linhas de custo mais importantes das empresas (salários e benefícios), precisa ter voz ativa e propor mudanças na gestão das equipes com foco em resultados.
Em um momento de transformação de negócios, especialmente em meio a uma crise como a que começamos a viver em 2020, é normal sentir insegurança. A saída é enfrentar de frente os problemas, buscando soluções criativas para eles.
Trazer pessoas com outras formações para criar perspectivas diferentes sobre seus problemas é um caminho importante nesse processo de inovação. Na Convenia, por exemplo, quando passado a discutir a experiência dos colaboradores (Employee Experience) se saiu da perspectiva de cargos, salários e benefícios e trouxe especialistas em Customer Experience. Afinal de contas, o colaborador também é um cliente.
Essa “reformatada” de visão foi importante não apenas para dar uma nova perspectiva, mas também para entender que esse é um processo que não tem vim. A mudança chegou e é para sempre. O exemplo do trabalho remoto na pandemia é muito significativo: todos tiveram que se adaptar e, acredite, não se voltará mais àquele estado anterior.
* Marcelo Furtado é CEO da Convenia.