* Por Orlando Seabra
Quando o assunto é inovação na indústria automotiva, é comum pensarmos nos carros elétricos ou na modalidade de veículo por assinatura. Essas são, claro, inovações no jeito de consumir, mas há uma questão básica que ainda precisa ser endereçada pelo mercado de automóveis no Brasil. Falta melhorar o “feijão com arroz” no setor, e eu explico por quê.
Imagine alguém que esteja assistindo a um anúncio num programa de TV sobre um novo carro que foi lançado ou sobre promoções e condições diferenciadas de financiamento para compra de veículos. A vontade, sem dúvida, é de acessar um site ou aplicativo e dar vazão ao desejo, certo? Em outras palavras, simular o crédito pelo celular ou computador, já contratar o seguro e assinar toda a papelada sem precisar da papelada em si.
Essa é uma experiência que já tem ocorrido no varejo como um todo. Quer comprar uma geladeira? Basta entrar num e-commerce ou marketplace e escolher a que mais gosta, inclusive podendo optar por diferentes formas de pagamento e parcelamento. Veja que esse processo de compra, já endereçado pelo varejo digital, não existe (ainda) no consumo de automóveis. Para financiar um carro é necessário ir a uma concessionária ou a uma loja de usados, conversar com um vendedor, saber quais as condições de financiamento, simular o crédito, esperar a aprovação… E lá se vão algumas horas do seu dia.
O fato é que o processo de compra no mercado de veículos ainda não foi ajustado para este novo momento de experiência de uso e, principalmente, de construir uma experiência “customer centric”, ou seja, que coloque o cliente no centro de tudo. Dependendo da marca e da região, às vezes o consumidor não consegue tampouco saber se há um veículo disponível naquele modelo e as cores. Do que adiantaria, então, ter um carro elétrico ou por assinatura se não é possível comprá-lo ou contratá-lo online, ou ser capaz de simular o crédito após ver um anúncio no Instagram?
A grande solução de curto prazo para a indústria de automóveis é entender que estamos na era do consumidor, num movimento que o varejo tem seguido, de criar experiências para que a compra seja feita com alguns cliques. Para que o mercado de veículos de fato possa inovar é preciso criar uma infraestrutura que permita aos clientes decidir o que e como vai consumir, sem necessariamente ter de sair de casa. Isso significa, por exemplo, entregar às concessionárias e revendedoras de usados plataformas de autoatendimento.
O brasileiro quer chegar a uma loja para fazer o test-drive de um automóvel, conhecer o veículo de perto, em vez de passar duas horas pedindo informações, simulando crédito até fechar a compra. Na prática, essa mudança de mentalidade tornaria a concessionária o que é ela, na essência: um showroom. Hoje, existem tecnologias e plataformas que possibilitam essa transformação no setor, tornando a experiência do consumidor mais simples, fácil e rápida.
Atualmente, o mercado de financiamento de carros e motos no Brasil movimenta em torno de R$ 200 bilhões ao ano, mas esse volume poderia ser maior, dada à baixa aprovação de crédito. Em resumo, enquanto grandes varejistas e marketplaces estão brigando para entregar os produtos em poucas horas ou no mesmo dia, o mercado de automóveis precisa resolver o “feijão com arroz”, antes de pensar nos próximos passos.
* Orlando Seabra é CEO e sócio-fundador da Credere, empresa que automatiza o processo de venda financiada de veículos.