* Por Cassio Spina
Atuando há quase dez anos com inovação corporativa, presenciei um fenômeno conhecido, mas pouco divulgado. Por isto, resolvi escrever este artigo como um alerta para que os C-levels e membros de conselhos estejam muito atentos aos sinais desta síndrome em suas organizações, bem como para que empreendedores de startups saibam como lidar com esta situação.
A história mostra que, inúmeras empresas líderes de seus setores, sucumbiram não apenas por causa de competidores inovadores, mas pela sua inércia e visão fechada ao que “não é inventado aqui”.
Muitos dos desafios culturais para a inovação já são bem conhecidos, como por exemplo, a resistência às mudanças, o medo da falha e a compartimentação do conhecimento. Eles constituem barreiras para a adaptação das empresas e transformação dos negócios para novas tecnologias. Entretanto, a síndrome do “não inventado aqui” é o maior entrave cultural para as empresas inovarem, pois não só gera resistência como boicota a inovação em si. E esse é o desafio mais difícil de ser superado, uma vez que os gestores acabam por bloquear a inovação de forma velada.
Destaco que “Open Innovation” é uma das ferramentas mais relevantes para as mudanças que praticamente todas as empresas precisarão efetivar a fim de sobreviverem à transformação que seus mercados estão passando. Assim, esta “trava” causada pelo medo de ter de admitir que alguém de fora possa fazer melhor do que si próprio, pode levar até a falência, como ocorrido em exemplos emblemáticos como a recusa pela BlockBuster em adquirir a Netflix por apenas US$ 50 milhões quando teve a oportunidade.
Já tenho vivenciado casos explícitos desta síndrome, em que propostas de inovação aberta foram rejeitadas sob diversos argumentos sem fundamentação real. E passado algum tempo, quem rejeitou a proposta, apresentou-a como sendo de sua autoria, demonstrando claramente que a questão era puramente de autopreservação. Entretanto, o tempo gasto com este processo muitas vezes não pode ser recuperado, havendo perda do timing para a inovação.
As causas desta síndrome são bem conhecidas: indo desde o ego e arrogância, até estratégias de autopreservação e autopromoção. A solução para evitá-la precisa ser bem aplicada, pois é um mal que precisa ser literalmente “cortado pela raiz”, tanto para eliminá-lo quanto para evitar que se dissemine na cultura da empresa, tornando-se um exemplo para todos.
Assim, é fundamental que a alta direção das empresas, sejam grandes corporações ou startups, esteja muito atenta a este problema, pois não prejudica somente oportunidades específicas, mas leva a contaminação cultural, fazendo com que os colaboradores engajados desistam e os resistentes fiquem cada vez mais ativos.
Diferentemente dos resistentes a mudanças, os chamados “late-adopters”, apesar de também serem um entrave à inovação, são normalmente transparentes. Já os contaminados por esta síndrome, atuam de forma dissimulada, muitas vezes parecendo serem abertos, mas por trás boicotando, atrasando ou sonegando informações, desviando a atenção ou até chegando a distorcer fatos.
Assim, para detectar estes casos, a alta direção precisa estar muito atenta, criando um ambiente aberto à comunicação com todos os colaboradores de forma direta, sem quaisquer barreiras, tanto passivamente quanto ativamente. Recomendo para todo C-Level que tenham conversas informais com subordinados indiretos, sondando quaisquer sinais que possam indicar a formação de uma cultura de privilégio à individualidade em vez da coletividade, que é o pilar da inovação.
Pelo lado das startups, caso tenham que enfrentar esta situação é importante destacar:
– Ao perceber tal comportamento, avalie se a oportunidade compensa todo esforço adicional que será necessário para superar este entrave.
– Se entender que o retorno justifica, é preciso atuar de forma indireta, ou seja, nunca levar a solução pronta. Pelo contrário, apresente apenas alguns elementos dela para “induzir” o gestor interno a ter a sensação de que ele criou a proposta detendo autoria. Este não é um modelo que tenha resultados garantidos, pois os riscos de insucesso ainda são altos e o tempo gasto certamente será maior, mas sendo a única alternativa viável, é o caminho efetivo.
– Por fim, a última alternativa, caso já tenha sido rejeitado, é escalar à alta direção para que esta tome uma decisão sobre a situação.
Mas, se nenhuma das alternativas acima funcionar, não pense que está tudo perdido, pois, pela minha experiência prática, “o mundo dá voltas” e já vi vários casos que acabam por ser retomados futuramente.
Gostaria de destacar que, por outro lado, tenho a satisfação em poder afirmar que a abertura à inovação tem sido cada vez mais frequente felizmente: já vi altos executivos pedindo conselhos e orientações com toda humildade, deixando clara sua abertura à inovação.
* Cassio Spina tem 35 anos de experiência nas áreas de tecnologia e inovação, atuando desde 2010 como investidor-anjo em startups, é o fundador e presidente da Anjos do Brasil e advisor em inovação aberta/corporate venture para grandes empresas pela Altivia Ventures.
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