A retenção de talentos e a diminuição da rotatividade de funcionários é um dos principais e mais complexos desafios encarados pelas empresas, em 2021. Após o início da pandemia, a opção pelo home office, como medida de segurança para os colaboradores, abriu de vez as fronteiras do digital, alterando paradigmas nos formatos de contratação adotados por grandes e pequenos negócios. Do dia para a noite, tornou-se possível e comum trabalhar para organizações em outra cidade, estado ou país, sem sair de casa.
Com isso, algumas companhias começaram a enfrentar a perda de conhecimento e recurso humano qualificado, visto que a competição por profissionais experientes e preparados, em quase todas as áreas, passou a contar com outros players, até então não calculados, devido principalmente aos limites físicos, inclusive internos. Hoje, uma corporação pode aumentar consideravelmente o número de servidores, sem preocupação com os espaços, agora virtualizados.
“Nós precisamos trabalhar duro para encantar as pessoas. O profissional tem que amar trabalhar com você. Não existe mais espaço para aquele chefe carrasco. Se tiver e o funcionário for bom – sobretudo na área de vendas e/ou tecnologia – ele vai embora, pois tem um milhão de empresas oferecendo trabalho para ele”, afirmou Maucir Nascimento, especialista em Growth, Marketing e Vendas.
No Brasil, estudo realizado pelo Vagas.com, site especializado em recrutamento, revelou que o número de ofertas de trabalho no modelo home office cresceu mais de 300%, durante a pandemia, chegando a 41% das oportunidades abertas. Outro levantamento, realizado pela Fundação Instituto de Administração (FIA), observou que 46% das empresas, de todos os portes, atuando no Brasil optaram pelo teletrabalho.
Nascimento, que é cofundador da Speedio, plataforma de geração de leads B2B com Big Data e Inteligência Artificial, destacou que o funcionário precisa gostar muito de onde ele trabalha. “Tem que ter um senso de pertencimento absurdo; ser identificado com a empresa e com os chefes. Ele precisa saber com clareza onde ele pode crescer e o que precisa fazer para isso. Precisa também ter sempre um horizonte para ganhar mais”, disse.
De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 11% de todos os trabalhadores do País, cerca de 8 milhões de pessoas, estavam atuando profissionalmente somente no padrão remoto (em uma economia de base como é o brasil, onde a maior parte dos trabalho é efetivamente físico – domésticas, frentistas, obras, industrias, etc – trata-se de um número bastante expressivo).
Os dados apontam para uma mudança profunda nos modelos de trabalho, em curto espaço de tempo, considerando também, ainda, o aumento da produtividade, uma vez que as horas dedicadas ao trabalho cresceram na mesma proporção.
Essa realidade provoca nas empresas, hoje, uma preocupação sobre como manter seus quadros e assim evitar novos e pesados investimentos em treinamento e contratação de pessoal. A manutenção do corpo de empregados treinados e já habilitados para lidar com as rotinas, compromissos, responsabilidades e objetivos estabelecidos, é fundamental para o desenvolvimento dos empreendimentos.
“Esse é o entrave a ser superado para a evolução dos negócios. A concorrência não é mais com o vizinho, agora a disputa pelas equipes de bom nível técnico é global. Chegam outras empresas que pagam mais, oferecem outros benefícios, e a retenção se transforma em algo extremamente difícil, desafiador para as companhias que precisam pensar em estratégias rápidas e eficazes para evitar a perda de outros profissionais”, explicou Danilo Konrad, CEO e fundador da Sales Hackers, assessoria que atua ajudando empresas a aumentarem suas vendas e entregarem produtos e serviços bem- sucedidos aos seus clientes.
De acordo com o especialista, a saída dos profissionais logo no início, o chamado “turnover”, começa antes mesmo de efetivada a contratação. O modelo dos processos seletivos também deve ser pensado para favorecer a continuidade dos selecionados, inclusive avaliando os melhores perfis para aquela oportunidade e no alinhamento de expectativas entre o empregador e o novo empregado.
“Se você não tem um bom processo de recrutamento, a chance de você sofrer um turnover logo nos primeiros meses é imensa. Mas a gente também orienta a realização de um plano de onboarding mais assertivo, ou seja, desenhar as rotinas de treinamento inicial e definir, alinhar junto aos contratados, logo no dia zero de trabalho, qual o mapa ele deve seguir para se desenvolver dentro da empresa, chegar a outros talentos, ser promovido. Enfim, as regras do jogo, inclusive o que leva à demissão”, complementou Danilo.
Retenção de talentos
Não se trata de mimar os novos funcionários. O trabalho de retenção é estratégico e fundamental para que a empresa atinja seus compromissos e objetivos com os clientes atuais, além de conseguir estabilidade interna para projetar outras responsabilidades com novos serviços, produtos e consumidores. Ou seja, administrar uma baixa rotatividade, com funcionários estimulados, é cuidar da saúde do negócio e aumentar a sua força no mercado.
Para isso, algumas outras ações também são importantes, tais como criar um plano de carreira, investir em inovação e tecnologia, construir um ambiente de trabalho humanizado e acolhedor, realizar trabalhos de aperfeiçoamento pessoal, dar atenção e escutar os colaboradores, dar mais autonomia, melhorar a comunicação interna e possibilitar algumas oportunidades únicas de talentos.
Esse conjunto de talentos ajuda a transformar a empresa também em uma marca empregadora, aumentando sua competitividade entre as demais, não só em relação à disputa por talentos. Esse empenho apresenta ao público uma companhia com preocupação de ponta a ponta com todas as etapas de execução de um serviço ou produção de um item. Mostra responsabilidade do negócio com as pessoas, com a entrega final e com o resultado.
“Com todas essas coisas somadas, e ainda se a empresa consegue trabalhar uma cultura de aprendizado, de rituais, consegue vender o sonho aos empregados, ela sai quase 100% efetiva, com chances praticamente zeradas de perder um talento. Nós inclusive gostamos de auxiliar as organizações até nas reuniões mensais de apresentação de resultado, na formatação desse momento, para estruturar melhor a camada de pessoas, estimulando e ajudando os funcionários. Não é só o salário que importa, a forma como as rotinas e esses movimentos pontuais são organizados é ainda mais fundamental e impactante no percentual de turnover”, acrescentou o Konrad.
Qualidade de vida
Vale destacar que os pontos destacados no planejamento para evitar a saída dos talentos têm mais correlação com a mudança de processos do que efetivamente com novos investimentos financeiros estruturais. Está mais conectado a uma transformação no roteiro do relacionamento do que exatamente com novas fontes de gastos. Todavia, é claro que aportes nesse sentido, se realizados, tendem a retornar, corrigidos com juros, no futuro.
Oferecer um plano de carreira real, transparente, possível, é imprescindível para que nos momentos decisivos os funcionários consigam avaliar com clareza suas oportunidades. Porém, também é interessante pensar em oferecer algo a mais, dentro da base orçamentária, como programas de intercâmbio, projetos inovadores para a própria carreira, desafios pessoais, espaços físicos e de tempo para cuidados com a saúde, possibilidades de home office, horários mais flexíveis e outras alternativas que mostrem a preocupação constante da empresa com os funcionários.