* Por Carlos Mira
O setor de transporte rodoviário de cargas no Brasil é um dos mais tradicionais da economia nacional. Sua origem data a década de 1950, com a instalação da indústria automobilística no país. Naquele momento, criou-se oportunidade para empreendedores que passaram a levar mercadorias dos pontos de produção até seus pontos de consumo, dando origem às grandes transportadoras do país.
Hoje, observamos que o setor se encontra espremido entre margens muito achatadas, devido à alta competição e à falta de restrições técnicas para a criação de novas empresas na área. O excesso de oferta faz com que essas companhias não consigam se diferenciar pela qualidade de seu trabalho, tornando o preço do frete o principal critério de escolha do cliente.
Este cenário tem sido alterado, nos últimos anos, pelo advento da tecnologia, que viabilizou a criação de diferentes modelos de negócio no setor. Novos players, cuja operação não se baseia em ativos fixos, mas em Big Data, algoritmos de recomendação e técnicas de colaboratividade como o crowdsourced delivery (modelo em que uma rede de entregadores autônomos realiza serviços para uma empresa), começam a ofertar seus serviços no setor de transporte de cargas.
É nessas condições – já abaladas pelos novos players hi-tech que trazem em seu DNA novos e disruptivos modelos de negócios e investimentos milionários – que as transportadoras mais tradicionais estão enfrentando a pandemia. Apesar do setor de transportes ser essencial, com os comércios fechados e o consumo de alguns itens (notadamente os considerados supérfluos, como roupas e eletrônicos) diminuindo, temos notado uma redução média de 50% no movimento dessas empresas, ao passo em que seus custos de operação – na maioria fixos – não acompanham essa redução.
Diante disso, devem se sobressair empresas que acompanharam as tendências do setor. Aquelas que atualizaram seu modelo de negócio, entraram de cabeça na digitalização de seus processos e que trouxeram investidores estratégicos para a sua sociedade.
Outro fator crucial para a sobrevivência destas empresas prestadoras de serviço são as pessoas que as compõem. Equipes motivadas por um propósito, que se identifiquem com a missão da companhia, tendem a prevalecer em momentos de crise, tendo a cultura empresarial como alicerce. Este é um momento de dedicar esforços e atenção ao time, tanto quanto de se preparar financeiramente para a crise que já se instalou.
Apesar de ainda estamos no meio da pandemia e não termos como prever o que virá pela frente, é possível fazer alguns prognósticos. Esse tsunami que está varrendo o setor de transportes vai em breve retornar ao mar, mas inevitavelmente com alguns danos colaterais no setor de transporte de cargas. As empresas que já não vinham financeiramente saudáveis, que não possuem uma tecnologia atualizada e que não têm em seus quadros colaboradores engajados com sua cultura são as mais propensas a não sobreviverem a essa crise.
Assim, o enorme excesso de propostas de frete e de serviço de logística e transporte existentes hoje no Brasil tende a se alinhar, definitivamente, à procura gerada pela indústria e comércio por estes serviços.
Isso não significa que o setor vai quebrar ou que faltarão caminhoneiros ou transportadoras, mas que haverá uma reorganização da oferta e demanda do setor. Após a pandemia, teremos empresas atualizadas digitalmente e mais profissionalmente organizadas no setor, e essas vão garantir o transporte e o abastecimento da sociedade brasileira.
* Carlos Mira é fundador e CEO do Truckpad.