* Por Guilherme Cruz e Maíra Leal
Não é de hoje que a concorrência entre bancos tradicionais e os comumente chamados “bancos digitais” ou fintechs tem crescido em ritmo acelerado. Especialmente porque as fintechs conseguem disponibilizar aos seus clientes praticamente todos os principais serviços que os bancos também oferecem hoje em dia, como financiamentos, empréstimos e pagamentos online, com a vantagem de o fazerem com muito mais eficácia e desburocratização para o consumidor final, graças ao intenso uso de tecnologia e baixo custo de operação.
Nesse sentido, os esforços dos agentes regulatórios do setor nos últimos anos escancararam ainda mais as portas do mercado para as fintechs. Podemos citar a Resolução nº 4.649 do Banco Central, que, em suma, estabeleceu a proibição aos bancos comerciais de limitar ou bloquear o acesso de outras instituições autorizadas pelo BC (inclua-se as fintechs) aos serviços e produtos comumente comercializados por aqueles, como emissão de boletos, cartão de débito, DOC, TED, etc. Assim, os bancos não tiveram outra alternativa a aceitar essas “parcerias forçadas”.
O fato é que, mesmo assim, as operações de empréstimo e financiamento das fintechs ainda obrigatoriamente lastreadas pelos bancos e instituições financeiras tradicionais limitava as fintechs a meros correspondentes bancários. A necessidade de um agente financeiro para tais movimentações tornavam os procedimentos mais onerosos. Inevitavelmente, esses custos eram repassados aos clientes.
Isso ocorreu obrigatoriamente até a edição da resolução 4.656 do Banco Central do Brasil que trouxe à faculdade das fintechs de continuarem tais parcerias ou se enquadras nos dois novos tipos de Instituições financeiras: a Sociedade de Crédito direto (SCD) e a Sociedade de empréstimo em pessoas (SEP).
A partir desse momento é que entra em cena um player que pode fazer toda a diferença nos rumos dos negócios envolvendo startups financeiras: os fundos de investimento em direitos creditórios.
Esses agentes têm sua participação nesse novo mercado, prevista e regulada, também pela resolução 4.656 do BC, seja integrando o quadro societário da SCD ou da SEP, seja atuando como credor nas operações de empréstimo e financiamento intermediadas por esta última.
No primeiro caso, os fundos poderão participar do quadro societário da SEP ou SCD após a oferta de ações, já que elas têm por obrigação serem constituídas como S/A. Caso essa participação seja igual ou superior a 15% eles serão detentores da chamada “participação qualificada”, conforme emana o inciso III do art. 2º da resolução.
Além disso, se, em conjunto com uma pessoa ou grupo de pessoas, os fundos de investimento concentrarem maioria do capital votante dessas sociedades, eles farão parte do chamado “grupo de controle” e certamente terão papel preponderante nas diretrizes da SCD ou SEP as quais sejam sócios. (p. único, art. 2º)
Na segunda hipótese é prevista a possibilidade, conforme artigo 8º, § 1º, III da aludida resolução, de os fundos atuarem como parte credora das operações de empréstimo e financiamento intermediadas pela SEP.
Faz-se necessário salientar que, nesses casos, a SEP tem vedação expressa de assumir o risco de crédito da obrigação assumida pelas partes, conforme preceitua o Artigo 10 da resolução 4.656.
Assim, a SEP pode proteger seu patrimônio em caso de uma eventual inadimplência de qualquer das partes, tendo liberdade para continuar destinando-o para seu rol de objetos elencados no art. 7º.
Com tanta inovação e segurança jurídica proporcionada por estes esforços regulatórios, as fintechs vêm conquistando um grande número de admiradores e usuários, principalmente entre o público jovem dessa geração pontocom. São dezenas de serviços já disponíveis, merecendo destaque a conta-corrente digital sem tarifa; cartão de crédito, quase sempre, sem anuidade; investimentos; consórcios; seguros e até empréstimos personalizados e com menores taxas de juros.
Pelo que parece essas novas startups, fortalecidas com os valiosos aportes dos fundos de investimento vieram para ficar. E nesse mundo globalizado e com escassez de tempo, de fato, já conquistaram uma parcela significativa de consumidores.
Portanto, a abertura dada recentemente aos fundos de investimento para participarem desse mercado de fintechs emergente no Brasil e no mundo tem se mostrado de grande importância para o fomento desse tipo de atividade, acirramento da concorrência e inevitavelmente o aprimoramento dos processos e serviços a ele relacionados.
* Guilherme Cruz é advogado e Maíra Leal é colaboradora, ambos do MLA – Miranda Lima Advogados.