* Por Dagoberto Hajjar
Uma vez fiz um curso de negociação onde o instrutor formou duplas, um sendo o comprador e o outro sendo o vendedor, e vendou todo mundo. Tivemos que negociar sem ver expressões faciais ou linguagem corporal.
Eu lembrei muito deste treinamento quando começou a quarentena e as negociações passaram a ser por videoconferência. Você vê o interlocutor numa janelinha pequena, com baixa resolução ou até mesmo com a câmera desligada. Mas, existem táticas para as negociações às cegas.
Vou começar explicando as 3 táticas mais usadas pelos profissionais da área de compras:
– Explica aí: o comprador vai fazer você explicar detalhadamente a proposta e fará cara de que está prestando atenção no conteúdo. Na verdade, ele quer saber se você é um técnico apaixonado pelo que está vendendo ou se você conhece técnicas de negociação. É uma perda de tempo enorme.
– Coitadinho: o comprador vai quase chorar na sua frente falando que queria muito comprar da sua empresa, mas que “infelizmente” não tem orçamento, mas que eles precisavam muito da sua solução e da sua parceria.
– Boxeador: o comprador vai procurar aspectos negativos da sua empresa e vai sair “dando soco” para todos os lados: vai falar mal de projetos antigos, de atendimento, de pessoas, de fofocas do mercado, do que for.
Nos 3 casos é teatro puro. Eu deixo o comprador fazer o teatro dele, respiro fundo e falo “muito bem, vamos começar a negociar. Vamos para a página 32…”
E aqui vou colocar 4 táticas fundamentais:
– Checagem de posições e interesses: eu sempre começo meu discurso com “Meu interesse aqui é estabelecer as melhores condições para nossas duas empresas. Existe algum ponto na proposta que te preocupa ou te deixa desconfortável?”.
Se o interlocutor for um profissional de compras, ele vai simplesmente ignorar a primeira frase onde eu falei do meu interesse, mas a segunda frase vai colocar ele em uma posição onde ele terá que mostrar suas necessidades, inquietações, preocupações, motivos, desejos, esperanças ou medos. Quanto mais informações eu conseguir nesta etapa, melhor.
– Objeções: eu uso uma regra de ouro. Eu nunca trato uma objeção antes de ter uma lista completa de objeções que o cliente tenha sobre a proposta. Quando o cliente falar a última objeção eu ainda peço para ele colocar as objeções em ordem de prioridade para ele. Eu aprendi que a objeção mais importante para ele é a última que ele vai falar e, tipicamente, se você tratar esta objeção mais importante, ele poderá abrir mão das demais.
– Checagem da legitimidade: o objetivo aqui é entender o raciocínio do interlocutor ou contraparte. Entendendo o raciocínio ficará muito mais fácil negociar ou contrapor. Eu uso frases como: “Você acha que isto seria justo para as duas partes? Por quê?”, “Me ajude a entender por que você está pedindo isto? Entender seu raciocínio me ajudará a achar as melhores alternativas”, “Entendo o seu argumento de que nosso preço está caro, mas por favor me ajude a entender por que você acha que nosso preço está caro, você está comparando com o quê?”, ” Você acha nosso prazo de implementação muito longo, baseado em quê? Qual é sua expectativa para o prazo de implementação e como você chegou a esta expectativa? Que cálculo você fez?”
– Checagem emocional: existe uma região no cérebro chamado “amígdala” (nada a ver com garganta) que é parte do sistema límbico e centro regulador da reatividade a estímulos biologicamente relevantes. Em uma reunião de negociação as partes estão em um momento de tensão muito grande e, ao menor sinal de perigo, a amígdala prepara o corpo para uma reação de guerra, mas com um efeito colateral, a pessoa deixa de entender o que está dito.
Você já deve ter saído de uma reunião e pensado “caramba…não lembro de uma palavra do que ele disse”. Você não lembra porque ouviu, mas não entendeu. A amígdala te desconectou por uns 15 ou 20 minutos. Então, em uma reunião de negociação temos que, frequentemente, checar se todos estão conectados e entendendo. Mais do que isto, temos que saber se eles estão gostando do que estão vendo e ouvindo. Eu uso frases como “isto faz sentido para vocês?”, “estamos no caminho certo?”, “é isto que você imaginava?”
Usando essas técnicas seremos excelentes negociadores, mesmo às cegas!
Dagoberto Hajjar trabalhou 10 anos no Citibank em diversas funções de tecnologia e de negócios, 2 anos no Banco ABN-AMRO, e 9 anos na Microsoft exercendo, entre outros, as atividades de Diretor de Internet, Diretor de Marketing e Diretor de Estratégia. Atualmente é sócio fundador da ADVANCE – empresa de planejamento e ações para empresas que querem crescer.