A pandemia chacoalhou o mercado de comércio exterior e fez vários players repensarem a logística internacional. A dependência exclusiva da China como o principal fornecedor, somada à nova realidade de custos dos fretes, provocou questionamentos e reacendeu a pauta de nearshore como forma de evitar a quebra da cadeia logística e garantir preços mais competitivos.
Muito utilizado pelas empresas de tecnologia, o termo nearshore consiste na terceirização de serviços de TI em países estrangeiros, mas com características em comum, se beneficiando de aspectos culturais e de fusos horários similares. Assim, um centro de delivery instado no México pode atender perfeitamente as demandas de outros países latino-americanos e dos Estados Unidos.
Mas como este conceito se aplicaria ao mercado de supply chain e em qual velocidade? De acordo com Rafael Dantas, diretor comercial da Asia Shipping, este movimento pode acontecer no prazo de dez anos, envolvendo investimentos superiores a US$ 1 trilhão dos principais importadores mundiais. As empresas que optarem pelo nearshore terão que reunir Know-how e tecnologia de ponta para propiciar fluidez, eficiência e segurança que os processos logísticos requerem.
Segundo o executivo, o nearshore está na pauta do setor e pode ser uma tendência a partir do momento que os investimentos saírem do papel. A principal vantagem seria contar com fábricas regionalizadas para atender uma demanda local, evitando rupturas na cadeia logística, como ocorreu com a China durante a pandemia de Covid-19.
Depois de praticamente parar em 2020, o país asiático retornou a toda velocidade em 2021 para atender a hiper demanda global, provocando um estrangulamento na capacidade de fornecimento de energia, que forçou o governo a religar usinas já desativadas. O cenário agravou-se com a escassez de matéria-prima, aumento demasiado dos fretes, falta de espaço nos contêineres e atraso nas entregas das mercadorias.
Se antes o envio de um contêiner de 40 pés da China para o Brasil custava US$ 1.500, o preço do frete atingiu mais de US$ 15 mil, em 2021, se estabilizando no patamar mais alto (cerca de US$ 10 mil no início deste ano). Outro episódio que agravou a situação foi o bloqueio do Canal de Suez durante seis dias, após um navio porta-contêineres encalhar no local. Mesmo com a resolução do problema, os reflexos do episódio perduraram por alguns meses, com gigantescos atrasos. Ainda no ano passado, com o avanço da variante Delta, a China fechou parcialmente alguns portos, como o de Ningbo-Zhoushan, o terceiro mais movimentado do mundo.
Com o surgimento de novos casos da variante ômicron e com a política de tolerância zero do governo chinês em relação à Covid, alguns especialistas não descartam o fechamento de outros portos, o que pode impactar novamente as cadeias de suprimentos globais. “As rupturas devem acontecer após o Ano Novo chinês, comemorado no final de janeiro, quando as pessoas se reúnem e pode haver disseminação do vírus. O feriado chinês deve ser um marco. A logística só vai se normalizar depois que a situação da Covid se normalizar. Se a pandemia continuar, os problemas também devem persistir”, destaca Rafael Dantas.
Segundo o executivo, a ideia principal do nearshore, conceito que ganhou relevância nas últimas semanas, é descentralizar a dependência de um único país, especialmente em cenários de incerteza. Porém é um processo que deve ocorrer gradualmente, pois os “desbravadores” terão que solucionar problemas políticos e de infraestrutura regionais, além de promover investimentos consideráveis em tecnologia e formação de mão de obra especializada para desenvolver uma nova cultura de comércio exterior. “Diante de tal desafio, coloco dois pontos para reflexão: O mercado logístico mundial está preparado para o nearshore? Modismo, fogo de palha ou tendência a médio e longo prazo?”, questiona o executivo.
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