* Por Julia Santana Vicente e Ellen da Silva Honorato
O mercado abrangido pelo modelo de negócio Business-To-Government (B2G) ainda é pouco explorado. Num geral, as startups que iniciam em um modelo de negócio que não exclusivamente o nicho govtech, posteriormente acabam esbarrando em dificuldades técnicas quando prospectam oportunidades de venda para o governo a fim de abrir mais possibilidades de mercado para os seus negócios. Por outro lado, pouco inova a Administração Pública engessada na contratação de produtos tradicionais de empresas tradicionais.
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Contexto licitatório
A antiga Lei 8.666/93 de Licitações e Contratos Administrativos desprovia de instrumentos jurídicos com um olhar voltado à modernização da máquina pública. Assim, as contratações públicas de produtos oriundos do ecossistema de inovação costumavam ser feitas através da contratação direta por inexigibilidade de licitação, haja vista a inviabilidade da competição, justificando-se normalmente pela exclusividade do objeto ou pela falta de concorrentes.
Já na nova Lei 14.133/21, que passa a valer oficialmente como diretriz licitatória exclusiva a partir do mês de abril, aprofundou-se debates com esse olhar. A novidade trazida é a adição da modalidade do diálogo competitivo, que em determinadas situações em que a Administração Pública não possui conhecimento técnico suficiente para satisfazer sua demanda, utiliza-se da ajuda de particulares. Dessa forma, desenvolve-se um diálogo com cada licitante no intuito de buscar a solução que atenderá a necessidade demandada e, escolhida a solução, abre-se a fase da competição em que os licitantes apresentarão suas propostas dentro de um prazo de 60 dias para que a entidade defina a opção mais vantajosa de acordo com os critérios firmados no instrumento convocatório.
Marco Legal das Startups
Concomitantemente, no mesmo período da promulgação da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, promulgou-se o recurso da Lei Complementar nº 182/21 sobre o Marco Legal das Startups. A norma estabelece princípios e diretrizes para a atuação específica da Administração Pública frente às startups, apresenta medidas de fomento a esse ambiente de negócios, disciplina a contratação de soluções inovadoras deste segmento pelo poder público e, ainda, põe fim às amplas interpretações dando um conceito definitivo para o termo startup em seu Art. 4º:
São os empresários individuais, as empresas individuais de responsabilidade limitada, as sociedades empresárias, as sociedades cooperativas e/ou as sociedades simples, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados e que:
I. Tenham receita bruta de até R$16.000.000,00 no ano-calendário anterior ou de R$1.333.334,00 multiplicado pelo número de meses de atividade no ano-calendário anterior quando inferior a 12 meses;
II. Tenham até 10 anos de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica;
III. Tenham declaração em seu ato constitutivo ou alterador e utilização de modelos de negócios inovadores para a geração de produtos e serviços nos termos do inciso IV do caput do art. 2º da Lei nº 10.973/04 e/ou enquadramento no regime especial Inova Simples nos termos do art. 65-A da Lei Complementar nº 123/06.
Como forma de dar aparato ao Estado para cumprir os dispostos em Lei, o Marco Legal das Startups instituiu uma modalidade especial de licitação. Essa modalidade permite que a Administração Pública contrate pessoas físicas ou jurídicas para o teste de soluções inovadoras desenvolvidas ou a serem desenvolvidas por elas, bem como restringe o escopo da licitação à indicação dos resultados esperados ou dos problemas a serem resolvidos, incumbindo ao licitante a proposição dos meios para a resolução dessas demandas.
Após a homologação do resultado do certame, este novo modelo celebra entre a Administração Pública e o vencedor um contrato administrativo diferenciado: o Contrato para Soluções Inovadoras. Este contrato tem vigência limitada a 12 meses prorrogáveis por mais 12 e, quando findado o período, a Administração Pública pode celebrar um contrato para fornecimento do produto resultante com a mesma contratada, sem a necessidade de uma nova licitação.
De um lado, a Administração Pública atenua o problema da escassez da contratação de soluções inovadoras, estimula o ecossistema de inovação fortalecendo mais formatos empresariais e se mantém atualizada sobre o que tem de mais novo dos produtos disponíveis no mercado. Do outro lado, as startups agora com maior facilidade expandem suas possibilidades de mercado e diversificam suas receitas com a opção de venda para o governo.
Portanto, se utilizado com bom proveito e em seu total potencial, a tendência é que este recurso mitigue problemas de longa data e promova uma relação ganha-ganha que engrandece aspectos econômicos com o estreitamento de laços entre os lados, consequentemente condecorando o mercado B2G.
* Julia Santana Vicente é bacharela em Administração Pública pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e atuante na área de governo eletrônico; Ellen da Silva Honorato é estudante de Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (Univali) e de Administração Pública na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC).
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