Albert Saniger, criador e ex-CEO da fintech Nate, foi formalmente acusado de enganar investidores ao apresentar um aplicativo de compras automatizadas por inteligência artificial que, na prática, dependia de operadores humanos terceirizados. A acusação foi divulgada nesta quarta-feira (10) pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DOJ), revelando que o sistema, promovido como ferramenta autônoma, funcionava com apoio manual em um centro de atendimento localizado nas Filipinas.
Fundada em 2018, a Nate arrecadou mais de US$ 50 milhões em aportes de fundos como Coatue, Forerunner Ventures e Renegade Partners, que liderou a rodada de US$ 38 milhões em 2021. A empresa prometia uma experiência de compra “universal” e instantânea, em que qualquer produto poderia ser adquirido com um clique, graças à tecnologia baseada em IA.
“Acreditamos que Nate era capaz de realizar transações online ‘sem intervenção humana’, exceto em situações pontuais”, destaca o comunicado do DOJ. Entretanto, a acusação afirma que a taxa de automação real era nula, mesmo após contratações de especialistas e investimentos em recursos de aprendizado de máquina.
Embora Nate tenha adquirido tecnologias e contratado cientistas de dados, o serviço oferecido aos usuários era executado, quase em sua totalidade, por trabalhadores contratados. Esses profissionais acessavam plataformas de comércio eletrônico manualmente, inseriam dados dos clientes e completavam as compras sem envolvimento direto de algoritmos.
A prática contraria as alegações feitas aos investidores, que viam na proposta uma oportunidade de escalar um modelo inovador com base em inteligência artificial. A investigação aponta que Saniger usou essa narrativa para levantar capital, ampliando a presença de Nate no mercado de tecnologia.
A operação de Nate foi encerrada em janeiro de 2023 após esgotamento dos recursos financeiros. Os ativos foram liquidados, e o prejuízo aos investidores foi descrito como “praticamente total”. Saniger deixou a função de CEO no mesmo ano. Atualmente, está listado como sócio-gerente da Buttercore Partners, fundo de investimento que não se pronunciou sobre o caso.
Saniger não respondeu aos pedidos de comentário feitos pela reportagem. O caso repercutiu em outros setores, reacendendo o debate sobre empresas que divulgam soluções baseadas em inteligência artificial sem, de fato, utilizarem essa tecnologia em suas operações centrais.
“O DOJ afirma que o aplicativo de compras supostamente movido por inteligência artificial era, na realidade, executado por pessoas contratadas para simular o funcionamento do sistema”, diz a nota oficial.
Esse episódio se soma a outros relatos recentes, como o de uma startup que alegava utilizar IA em atendimentos por drive-thru, mas operava com trabalhadores remotos. A prática, conhecida informalmente como “pseudo-automação”, levanta questões sobre ética, transparência e regulação no uso comercial da inteligência artificial.
As investigações continuam, e Saniger poderá responder por fraudes contra investidores caso as acusações sejam confirmadas. A acusação sustenta que a deturpação das funcionalidades da Nate comprometeu decisões financeiras com base em informações incompletas ou enganosas.
O caso da Nate evidencia a importância de validação técnica e auditoria em negócios que se apresentam como baseados em IA. A distância entre discurso e realidade operacional, segundo analistas, pode gerar não apenas perdas econômicas, mas também danos à credibilidade de um setor em plena expansão.
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