* Por Anna Valle
“No fim do dia, da semana, da minha vida, quero dizer que contribuí mais que critiquei. Simples assim”. Com essa frase de Brené Brown, quero explorar a profundidade do tema do empreendedorismo feminino. Algo tão complexo – mesmo que, aparentemente, simples.
Simples, quando pensamos que isso deveria e poderia ser óbvio. Complexo porque os números, estatísticas e o dia a dia nos mostram que ainda não é tão óbvio assim e temos uma longa estrada a percorrer. Sim, existem fatores históricos e sim, estamos evoluindo, por isso, vamos focar aqui na parte boa da coisa, na contribuição e vamos juntos!
Esses dias, em uma mentoria, ouvi uma história que acho que ilustra bem uma das principais características dos empreendedores: “Existem dois tipos de pessoas, os catadores de feijão e os catadores de diamantes. Os catadores de feijão são aqueles que colocam todos os grãos na mesa e começam a separar o que é ruim, o que não dá certo, o que precisa ser descartado. Os catadores de diamantes vão procurar, no meio da lama, alguma coisa que possa brilhar, que possa ter valor. Ou seja, procuram grandes oportunidades!!”. Isso é empreender! Tem muito a ver com sonho, coragem, meta e realização, é puro foco na solução, é a busca constante pelos diamantes.
Para ilustrar, vou compartilhar duas histórias simples, de épocas e situações diferentes, mas que me trouxeram grandes aprendizados.
Quando eu tinha uns 6 anos, acredito que dei um dos meus primeiros passos em direção a isso: meu maior sonho era ir pra Disney e meus pais falaram que quando eu tivesse 12 anos eu poderia ir; para isso, precisaria basicamente de duas coisas: aprender inglês e arrumar dinheiro… rs… e lá fui eu estudar. Naquela época, na minha cidade, no interior de Minas, não era muito comum estudar inglês com aquela idade; no começo, eu era a mais nova da minha turma, mas eu não estava nem aí!
Resolvendo a questão do inglês, a outra necessidade para eu atingir meu objetivo era a financeira. Eu criava umas vacas (de verdade mesmo, sou do interior), ganhei uma quando nasci, chamava Nata, e ela procriou, e a filha dela procriou e assim por diante, no fim eu tinha umas seis vaquinhas que seriam, literalmente, os recursos da minha tão sonhada viagem!
Foi meu “primeiro trabalho”, eu tinha uma agenda com tudo anotadinho (ah, se eu já conhecesse o Excel, rs), vários indicadores: a produção de leite diária, semanal, mensal, data de inseminação e data prevista do “parto”. Aprendi a mexer no sistema e acompanhava bem de perto cada relatório. E foi assim que consegui minha primeira grande meta: com 12 anos, vendi as vaquinhas e fui em uma excursão pra Disney.
Da minha cidade, fomos eu e mais 3 meninos (que eu só conhecia “de vista”), todos mais velhos. De novo, eu era a caçulinha, mas isso não me intimidou, muito menos o fato de ser a única menina – nunca tive problema com isso, nunca me senti nem melhor nem pior – simplesmente queria e acreditava em algo maior: era meu sonho que virou meta e lá fui eu! Com isso, aprendi uma coisa que me acompanha até hoje: “Sonhe sempre e transforme seus sonhos em metas, a diferença entre o sonho e a meta é a data para realização.” Embora pareça uma coisa simples, de uma “historinha” simples e infantil, isso faz toda a diferença!
Seguindo novos sonhos, novas metas, fui para Universidade Federal de Santa Catarina fazer engenharia. Sempre muito inquieta, fiz estágio desde o primeiro semestre, participei de diversos projetos da faculdade que me renderam muitos aprendizados e networking. Assim, mesmo recém formada, já tinha alguma experiência e vários contatos na área.
No mesmo ano da minha formatura, recebi uma proposta para vir trabalhar e morar em São Paulo, ser gerente de uma empresa de Logística! Sem pensar muito, aceitei! Foi um desafio gigantesco! Imaginem, eu com 24 anos gerente de uma empresa de logística tradicional, em que a maioria dos funcionários e clientes eram homens e muitos tinham mais tempo de empresa do que eu tinha de idade.
Logo nas primeiras semanas, tinha um programa de Coaching que a empresa oferecia aos gerentes e a coach me falou um dia: “Anna, você é muito menininha! Precisa usar botina, calça jeans e camisa para demonstrar autoridade; sua sala precisa ter uma cadeira alta e imponente!”. Não que eu não goste desse traje, adoro… pra andar à cavalo, ir para a roça, não para “ser líder”. E não julgo quem gosta! Mas fiquei um pouco desconfortável com aquela sugestão: será que minha maneira de vestir e “a minha sala” seria o diferencial da minha liderança?
Não acreditava naquilo (e não consigo fazer o que não acredito, sempre procuro uma forma que condiz com meus princípios e valores, e aquela, definitivamente, não era!). Eu precisava achar uma outra solução. E aí pensei na empatia, identificação e pertencimento! Qual seria (naquele momento) uma coisa em comum com a maioria?! Encontrei no futebol era um primeiro elo potencial! Não pensei duas vezes! Desci a minha mesa para a operação (“It´s all about people”, precisava estar próxima, conhecer melhor as pessoas), peguei minha camiseta do Corinthians (que é meu time do coração e estava super bem em 2011) e coloquei na minha mesa! Pronto! Tínhamos ali um quebra-gelo, o início de uma bela relação.
O segundo passo, foi a construção verdadeira, demonstrar aquilo que tanto acredito: o respeito pelo sonho de cada um e nossa responsabilidade pelo resultado em conjunto e o trabalho em equipe! E que equipe! Durante 6 anos me proporcionaram muitos aprendizados, conquistas e me ensinaram muito sobre humildade, perseverança e fé!
Com muito trabalho, dedicação, resiliência, flexibilidade, grandes desafios e também barreiras, obstáculos, preconceitos, piadinhas, fui promovida a diretora de Operações, até que no final de 2017 esses obstáculos me venceram – ou eu venci esses obstáculos – depende de como queremos enxergar. O que importa é que eu tinha uma nova folha em branco, muito mais bagagem, muito mais calos e autoconhecimento com meus valores e princípios (que me acompanham desde a infância) ainda mais fortes e consolidados! Era hora de recomeçar! Recomeçar dá medo. Mas, outra coisa que acredito é: “Se der medo, vai com medo mesmo!” O importante é não paralisar.
E, voltando à busca pelos diamantes e aos sonhos… desde então, estou vivendo um novo sonho! Junto com mais 3 sócios incríveis, estou empreendendo. É fácil empreender?! Com toda certeza não e é não mesmo! Provavelmente a coisa mais difícil que já fiz até agora. Mas é bom demais e extremamente gratificante fazer o que a gente acredita de verdade, com pessoas com os mesmos valores e princípios, construir algo, ver os resultados, comemorar cada conquista, por menor que ela seja! É maravilhoso! De novo, sonhar e realizar! E “Vamo que vamo!”.
Para finalizar, gostaria de dividir algumas coisas que eu fui aprendendo ao longo dessa jornada, que eu acredito muito e uso como guia:
– Sonhe sempre e transforme esses sonhos em metas! A diferença entre sonho e meta é a data para realização!
– Faça sempre o seu melhor! Isso só depende de você!
– Tome as suas decisões! Se algo der errado, olhe no espelho e não na janela!
– Ouça e valorize as pessoas! Cultive seus amigos!
– Não desista!
– Não realize perda! Sempre dá para transformá-la em ganho!
– Acredite em você!
– Nunca abra mão dos seus valores e da sua saúde!
– Se der medo, vá com medo mesmo!
– Na dúvida, escolha a família!
– Seja grato!
– Seja positivo, tenha fé e acredite em algo maior, no meu caso, Deus!
Bora ser feliz e catar diamantes! A vida é muito curta para ser pequena!
Anna Valle é empreendedora, fundadora e COO da Quattro, startup membro do Cubo Itaú de tecnologia para logística e supply chain que tem como principal produto a Flowls: plataforma SaaS para integração e automação dos fluxos de informações da cadeia de suprimentos, que conecta os intervenientes e automatiza processos com auxílio de robôs, proporcionando uma melhor gestão, planejamento, controle e rastreabilidade das operações logísticas, de ponta à ponta.