*Por Paulo Moura
O mundo das fraudes é, do ponto de vista dos fraudadores, uma questão de aproveitar oportunidades. Como diz o dito popular, “a ocasião faz o ladrão” e os criminosos estão sempre buscando oportunidades para aplicar novos golpes. Com a flexibilização da pandemia e a retomada das viagens, esse setor voltou a ser um alvo para as fraudes digitais. Por conta da pandemia, as empresas do setor de viagens reduziram suas equipes e, nesse novo momento, precisam preencher as cadeiras rapidamente. Quando falamos de profissionais de tecnologia e segurança, o conhecimento detalhado de prevenção a fraudes não é tão fácil de ser reposto e, mesmo que fosse, sempre há um período de adaptação e aprendizado por parte dessas equipes.
Desde o ano passado, instituições como o Better Business Bureau vêm emitindo alertas sobre o aumento dos incidentes envolvendo fraudadores que se passam por agências de viagens, seja por telemarketing ou por meio de sites que imitam as verdadeiras plataformas de venda de passagens, hotelaria ou locação de automóveis. A plataforma RoboKiller fez uma estimativa ainda no ano passado de que o volume de fraudes no setor de viagens aumentaria cerca de 80%.
Mas por que o turismo é um alvo dos fraudadores? Porque as passagens aéreas e reservas em hotéis têm um alto valor de revenda e costumam ser itens digitais que só se tornam disponíveis fisicamente no momento de uso. E uma série de razões faz com que as fraudes continuem tendo sucesso. A primeira delas é que um bom storytelling pode fazer maravilhas: uma comunicação que pareça real e leve para um site que seja muito parecido com o verdadeiro tem uma boa chance de enganar os clientes. Outra é a oferta de prêmios bons demais para serem verdade, como cruzeiros gratuitos ou grandes descontos.
E essa é apenas a primeira perna do golpe contra os clientes: neste momento, o objetivo dos fraudadores é capturar dados de pessoas reais para usar mais tarde onde desejarem.
Impactos em cadeia
É na fase seguinte que as fraudes mostram seu verdadeiro impacto. Os criminosos podem, por exemplo, adquirir passagens aéreas ou rodoviárias para si mesmos algumas horas antes da viagem, já que a falta de tempo dificulta uma boa análise de prevenção de fraudes. Nas companhias aéreas, uma forma frequente de fraude é a troca da categoria do assento, em que o “cliente” compra com antecedência uma passagem econômica e, pouco antes do voo, faz o upgrade online para outra categoria com um cartão de crédito roubado.
Existem também casos que poderiam render um Oscar para os fraudadores. Nas chamadas “fraudes de engenharia social” — que de engenharia têm muito pouco, por sinal — os golpistas compram uma passagem para daqui 2 ou 3 meses. Com a passagem aprovada, o fraudador liga para a companhia e usa seus talentos teatrais para inventar uma história convincente e solicitar a antecipação do voo.
Claro que não podemos esquecer do mercado paralelo de venda de dados. Aquelas informações de cartões coletadas a partir de sites fake são vendidas na deep web e se transformam em novas fontes de receita para os fraudadores. Com isso, o impacto negativo da fraude é multiplicado.
Se as fraudes tivessem apenas um impacto pontual, isso já seria um problema sério. Mas a questão é ainda mais complexa, pois, com frequência, as fraudes têm um impacto financeiro importante sobre um setor que opera com margens apertadas. Um impacto que se espalha ao longo de toda a cadeia envolvida: a instituição financeira, a empresa aérea ou rodoviária, a locadora de automóveis, o hotel, todos podem ser impactados.
Como evitar as fraudes?
As melhores plataformas antifraude do mercado são capazes de identificar problemas com um nível de sofisticação cada vez maior. Para barrar a ação de fraudadores, os sistemas precisam avaliar aspectos como:
Geografia: a compra de uma passagem para um lugar registrado que seja muito distante do local de origem do cartão tem que levantar alertas e suscitar análises mais profundas sobre a transação. Normalmente, um cliente que mora em São Paulo compra uma passagem aérea ou rodoviária que saia da própria cidade ou termine nela. Afinal, ou ele comprará para si ou para um parente próximo que mora com ele ou que venha visitá-lo.
Timing: essa é uma questão muito delicada para companhias aéreas e rodoviárias. Quando uma compra é feita com antecedência, existe um prazo maior para avaliar a veracidade da transação. Mas e quando um cliente compra uma passagem para o ônibus que vai sair em 15 minutos? Não é à toa que os fraudadores costumam usar janelas de tempo curtas para cometer fraudes. Ao mesmo tempo em que esse tipo de transação deve levantar alertas, é preciso contar com um sistema que consiga identificar as compras verdadeiras e barrar somente as fraudes.
Consistência: pessoas tendem a seguir determinados comportamentos, como o uso de seu cartão a partir de determinado IP (sua casa ou escritório), de um certo dispositivo (seu celular ou computador) e em certos horários (depois do almoço ou ao chegar em casa à noite). Uma transação fora dos parâmetros comuns exige análises mais cuidadosas.
Informações indiretas: com o aumento da sofisticação dos fraudadores, o uso de senhas e habilitações de dois níveis já começa a ser insuficiente. Somente o acompanhamento do consumidor e o uso de centenas de informações indiretas consegue criar um quadro efetivo que identifique aquele cliente como sendo real. Tecnologias como a KnowYourUsers, da Nethone, analisam milhares de pontos de contato com o cliente e até mesmo características como a velocidade de digitação e o tempo de navegação em cada página para determinar se uma transação é verdadeira ou fraudulenta.
Por último, mas não menos importante, também é importante ressaltar o surgimento das fraudes sintéticas, um dos modelos de crime mais novos em que a tecnologia é usada para criar perfis aparentemente reais e altamente detalhados de consumidores. Esse estilo de fraude, por ser recente e desconhecido, muitas vezes não é diagnosticado corretamente por grande parte das ferramentas de prevenção a fraudes. O mundo da prevenção a fraudes é um eterno jogo de “gato e rato” entre fraudadores e empresas. E é um mundo de paixões: de um lado os fraudadores têm paixão em fazer dinheiro com o seu prejuízo. De outro, precisamos ter paixão por impedir esses prejuízos. Com o uso intensivo de tecnologia e criatividade, nossa paixão por defender as empresas gera excelentes resultados.
*Por Paulo Moura, VP de Business Development da Nethone no Brasil