* Por João Kepler
Nessa semana o ecossistema de Startup ficou alarmado com uma thread no Twitter do Investidor Tom Loverro onde ele faz uma previsão que “há um evento de extinção em massa chegando para startups em estágio inicial e intermediário”.
Ele prevê que “O final de 2023 e 2024 fará com que a crise financeira de 2008 pareça estranha para as startups” e completa dizendo que “as grandes startups sempre serão financiadas, embora não nos termos de 2021. Muitas startups “boas” vão ter que encarar down rounds e outras muitas startups sem ainda atingir o PMF (Product Market Fit) morrerão em uma taxa maior do que qualquer coisa que vimos desde 2008”. Ainda por fim, oferece 7 conselhos “milagrosos” para sobreviver e evitar “à extinção iminente” como ele comenta.
Mas começo afirmando o seguinte: ACALMA-TE!
No Brasil as boas startups early stage (com produto, gestão, governança e vendas) sempre terão grana e sim, continuarão recebendo investimentos.
Mas vamos aos meus 15 pontos de análise:
1. Sempre soubemos que mais de 50% das startups falham ou vão falhar. Isso não é nenhuma novidade! Os empreendedores e os investidores conhecem as estatísticas e os riscos envolvidos, aliás o nome da nossa atividade é VENTURE CAPITAL (Capital de Risco), exatamente por isso. Portanto afirmar que haverá uma extinção em massa e iminente das Startups é no mínimo um exagero, para não dizer desrespeito com milhares de empreendedores e investidores de startups brasileiros.
2. É fato que os VCs estão mais prudentes nas análises das oportunidades e mais técnicos nos racionais de valuations das rodadas, isso é muito bom, o que aconteceu em relação a “abundância” e rodadas mirabolantes em startups later stage, certamente não acontecerá mais daqui pra frente.
Isso chamamos de “freio de arrumação” e não de “o fim dos investimentos”.
3. Não é também novidade que o risco de falha e de “morte” está agora maior nas startups em estágio inicial e intermediário. Elas morrem, continuam e vão continuar morrendo, não somente por não conseguir captar investimento, mas por vários outros motivos. Segundo a CBInsight, que mapeia as 12 principais razões para o fracasso, os motivos vão desde a falta de adequação do serviço e produto ao mercado à desarmonia do time fundador. A Falta de Investimento é apenas uma das razões e não A única ou A maior das falhas.
4. Sobre o PMF (Product Market Fit) as rodadas de investimentos nos estágios iniciais aceleração, anjo, pré-seed e seed existem exatamente por isso, para permitir que às Startups pivotar e buscar o modelo ideal desde os estágios iniciais à ideação, passando por MVP, validação e desenvolvimento, até atingir o PMF e, só depois, seguir com as rodadas series A, B, C e assim por diante.
5. Nos estágios iniciais (Early Stage) o racional do valuation é muito pé no chão e no Brasil já aplicamos o múltiplo entre 6x e 10x ARR. Valuations esticados dificilmente emplacarão daqui por diante. Ou seja, já estamos mais conservadores e não é nenhuma novidade o suposto padrão de múltiplos daqui por diante, alertado pelo Tom Loverro.
6. As Startups brasileiras early stage têm sido orientadas a buscarem o breakeven e a terem um runaway bem maior
7. Empreendedores brasileiros são resilientes, flexíveis e adaptáveis. Essa crise global que estamos vivendo (inflação, recessão e mais dificuldade de acesso ao crédito) além de mais um obstáculo e desafio, será também uma grande oportunidade para empreendedores se organizarem e se prepararem.
8. Além disso, no early stage, apesar do índice de morte ser maior, os cheques são bem menores e pulverizados, fazendo com que as taxas de retorno no longo prazo sejam inclusive melhores, ou seja, apesar de menos maduras, investir em startups early stage é mais vantajoso. Diversos estudos já comprovam que investimento no começo e em mais startups, afeta positivamente o resultado do portfólio.
9. De fato, é verdade que grande parte das startups não conseguiram ou evitaram fazer rodadas em 2022. Por isso, haverá um excesso de Startups captando e, embora exista muito capital (Dry Powder) a ser alocado (inclusive no Brasil), o Venture Capital ainda será mais seletivo, investindo em Startups Camelos e Cabras da Montanha, em vez de financiar qualquer promessa ou sinal de um novo unicórnio, como foi feito em anos anteriores.
10. Os tempos de dinheiro em abundância de fato seguem distantes em 2023, sobretudo por ter ocasionado ondas de demissões que deixaram milhares de pessoas desempregadas nas Startups LATER STAGE, BIG TECHS e STARTUPS UNICÓRNIOS, como podemos acompanhar em sites que mostram os Layoffs. Isso NÃO ACONTECEU nas startups iniciantes. O investimento de Venture Capital para estes perfis de Startups vai continuar, mas virá direcionado a garantir um crescimento sustentável (não a qualquer custo), não aceitando mais grandes custos fixos, com estrutura física desproporcional e com pessoas com remuneração muito agressiva. Falei sobre isso nas minhas previsões e perspectivas na virada do ano.
11. E exatamente por isso, estamos percebendo movimentações de diversas casas de investimento em Venture Capital antecipando o momento de seus investimentos, ou seja, destinando seus recursos a Startups em estágios mais iniciais como SEED e PRÉ-SEED. Na contramão do que disse o Tom, no Brasil as casas estão investindo cada vez mais diversificado e mais cedo, para garantir uma boa originação de Startups e acompanhar o desenvolvimento e crescimento delas. E claro, melhorar a rentabilidade dos seus fundos nós próximos 6 a 10 anos.
12. Mesmo com todo a alarde e generalização exacerbada, investidores qualificados e profissionais sabem que apesar de ser um ativo ilíquido e de muito risco, é uma classe de ativo convexa e descorrelacionada e por isso, entendem que devem continuar diversificando, direcionando e equilibrando as suas carteiras de investimento de forma mais consciente e respaldada entre 5% a 10% do seu patrimônio líquido para terem boas possibilidades de retorno no longo prazo.
13. Um ponto que poderia ser fatal para Startups no médio prazo, é não se adaptar às novas tecnologias como a Inteligência Artificial que pode sobrepor ou substituir de forma instantânea e com menos custo, as soluções que as Startups se propõem a resolver. Se elas não se adaptarem, desenvolverem, integrarem ou desenvolverem APIs, ai sim, essas Startups tendem a deixar de serem essenciais para o mercado.
14. Os alertas deste tweet do Tom Loverro para o momento de crise são importantes, assim como foram os alertas na pandemia. No entanto, não cabe a ele declarar e deixar dúvidas sobre o suposto o fim de um ecossistema, até porque estamos falando de tecnologia que tende a ser cada vez mais essencial para resolver problemas da humanidade.
15. Por fim, termino minha analise lembrando e informando que apesar de o melhor dinheiro ser o dinheiro do cliente, captar funding nas fases da Startups e na escada de investimento, é importante para o contexto do Jogo do Equity e é a essência desse modelo. E isso não quer dizer “cultura do crescimento a qualquer custo” instigada por grandes fundos no passado recente e também alardeada e generalizada pelos “de fora” ou os “do contra” que não entendem como realmente funciona o Capital Empreendedor, que na prática, é o investimento para crescimento orgânico, sustentável e saudável.
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João, e sobre as dicas para sobrevivência que o Tom falou?
Antes de enumerar e responder, é preciso dizer duas coisas:
Que desde a pandemia já havíamos orientado o mercado e as nossas Startups Bossanova através de um manifesto público sobre o que eles deveriam fazer para enfrentar o momento. Portanto, as Startups Early Stage no Brasil, já se preparam desde antes do começo desta crise mundial e altas taxas de juros.
Que em julho de 2022 o Fundo IVP (onde o Tom é General Partner) publicou em seu site, um artigo de Somesh Dash que é também GP do fundo: 7 maneiras pelas quais os fundadores lideram em tempos incertos. Não sei se é coincidência o número 7, mas as dicas deste artigo são muito mais prudentes e reforçam que a resiliência em tempos de crise é o melhor caminho. A dica número 1 é: Sintonize as previsões de destruição: “Quando a bolha pontocom estourou no início dos anos 2000, pessoas sérias previram que a era da internet havia acabado. Após a crise financeira de 2008, as Startups estariam supostamente “mortas”. Por isso, fiquei na dúvida sobre o discurso e posicionamento deste Fundo.
1. Faça captação de recursos agora ou antes do esperado, antes da Grande Dilúvio de 2023. Se você falhar, pode sempre tentar novamente mais tarde. Mas se você esperar, pode tentar depois e falhar.
Não entendi, ele falou no texto que a fonte secou e orienta as Startups nesses 7 passos a captarem!? Minha orientação aqui é no sentido de captar apenas conforme o plano e seguir os estágios e as rodadas normalmente. A questão aqui não se trata de esperar ou não pelo apocalipse no fim do ano, se trata de seguir seu plano, escolher corretamente o investidor (por tese e smart money) e de saber distinguir INSISTÊNCIA de PERSISTÊNCIA.
2. Você fez uma dispensa e cortou a queima de caixa? Ótimo. Agora corte a ainda mais. Corte o que é “bom ter”, mas continue a financiar P&D principal.
Aqui eu não discordo, porém, a forma banal de falar em descartar pessoas e demissões, me incomoda. Mas ele deve tá se referindo a queima de caixa exagerada nas Startups nas Later Stages e não nas EARLY Stages. Até porque, o breakeven sempre foi o direcionamento das startups antes do série A. O outro ponto é que recomenda continuar desenvolvendo P&D (pesquisa e desenvolvimento)? Mas com qual dinheiro?
3. Concentre-se na sobrevivência, não no valuation. Não deixe seu ego ou viés de ancoragem matar você. Os preços das ações das empresas públicas sobem e descem a cada microssegundo. A flutuação do preço de suas ações não é fatal. Ficar sem dinheiro é.
Aqui eu concordo plenamente.
4. Para startups de estágio intermediário e avançado, traga operadores experientes em cargos de nível C e, para algumas empresas de escala, pode até significar contratar CEOs profissionais. Feito corretamente, isso permite que os fundadores joguem com seus pontos fortes.
Aqui eu concordo, neste item ele endereçou corretamente: Startups Later Stage. Reforço aqui a importância também da implantação urgente da Governança.
5. Troque crescimento por melhores unit economics. As taxas de crescimento estão diminuindo para todos este ano. É tudo relativo quando você está captando dinheiro. Se você conseguir acertar unit economics, sempre poderá aumentar a queima e o crescimento posteriormente.
Aqui eu também concordo plenamente.
6. Jogue suas cartas corretamente, sobreviva e vá para o ataque. O melhor momento para construir e conquistar participação de mercado é quando sua concorrência está morta/em retirada. 2021 parecia o melhor ano para construir uma startup, mas também parecia o melhor ano para comprar ações de alto crescimento 😉 Agora é a hora!
Aqui bugou minha cabeça, ele manda ser prudente no texto todo e agora no final, manda além de sobreviver, ser mais agressivo? uéé!?
7. Seja decisivo. Meias medidas raramente dão certo.
Seja intencional meu amigo, seja equilibrado e Gestor, se preocupe com o seu breakeven, com seu time, com a sua governança e com sua vendas. Tenha pressa sim, mas não seja apressado!
Prudência, Gestão e Transparência sempre fizeram parte da estrutura e estratégia da Bossanova Investimentos. Como líder e VC mais ativo em Early Stage na América Latina (veja a imagem abaixo do recente ranking anual da TTR Data), temos um compromisso com o mercado de mostrar a realidade e não somente ser otimista.
Por isso é necessário esse posicionamento público contra qualquer generalização, desconhecimento e banalização das Startups.
Aproveito para agradecer aos Empreendedores pela leitura e suporte e aos Investidores Brasileiros por continuarem investindo em Capital Produtivo, em GENTE e em Startups Early Stage. O BRASIL agradece!
João Kepler é CEO da Bossanova Inestimentos, venture capital mais ativa da América Latina. Especialista na relação empreendedor-investidor, foi premiado por 4x como o Melhor Anjo-Investidor do Brasil pelo Startup Awards.
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