* Por Lucas Marques
Nas próximas linhas vou compartilhar com vocês dados que sugerem que a revolução do sistema bancário brasileiro já começou. Antes, gostaria de fazer algumas ponderações:
– O artigo é longo, mas prometo que o conteúdo é bom e vale ir até o final, principalmente para quem gosta de tecnologia, startups, fintechs e setor bancário. Vamos analisar, ao longo do artigo, a disputa de share dos bancos digitais x bancos tradicionais por faixa etária, classe econômica e região do país.
– Os dados foram consolidados a partir de movimentações de resgate de cashback para contas bancárias, realizadas por usuários do Méliuz. Para quem não conhece, o Méliuz é a maior empresa de cashback do Brasil, com 9 milhões de usuários e 1600 lojas parceiras. Vale ressaltar que, para não comprometer o sigilo dos nossos usuários, vamos abrir os dados apenas de forma consolidada.
– Esse artigo não tem pretensão de ser uma monografia de doutorado, muito menos um estudo de estatística preciso. A ideia aqui é muito mais tirar insights a partir de uma grande quantidade de dados e ressaltar aspectos importantes acerca do assunto. Isso é possível porque a distribuição dos usuários do Méliuz (que já fizeram resgates de cashback) em termos de faixa etária, classe econômica e região do país é bem similar à distribuição da população brasileira.
– O título do artigo é uma referência aos dados bancários de usuários do Méliuz. Porém, ao que tudo indica, também é uma previsão do futuro para o mercado financeiro brasileiro como um todo.
Nubank está atropelando
Como podem ver pelo gráfico, nossos usuários começaram a fazer resgates de cashback para contas bancárias do Nubank de forma muito tímida em dezembro de 2017. Depois disso, o que observamos é um crescimento rápido e consistente da instituição até que, no final de 2019, ele conquista o maior share de contas bancárias em uso pelos nossos usuários. Para ser mais preciso, o Nubank passou o Banco do Brasil por algumas centenas de contas e, observando a tendência desse começo de ano, não temos nenhum indício de que esse ganho de share vai parar.
Algumas observações:
1. A Caixa manteve o mesmo share durante esse período;
2. Banco do Brasil, Itaú, Bradesco e Santander perdendo share de forma rápida e consistente;
3. O Banco Inter, que era um banco tradicional e está em transição para se tornar um banco digital, ganhou 3% de share no mesmo período que o Nubank ganhou 18%.
Minha leitura é que esse ganho de share do Inter demonstra que, embora a decisão de se tornar um banco digital se mostrou acertada uma vez que ele ganhou share enquanto a maioria dos bancos perdeu, o crescimento do banco ainda é muito lento se comparado ao rival Nubank.
Ficamos muito curiosos com essa mudança no mercado e resolvemos investigar os dados por faixa etária, região do país e renda declarada. Como não temos esses dados de 100% da nossa base, tivemos que trabalhar com uma base menor, mas ainda sim muito significativa e relevante.
Análise por faixa etária
Como já era de se esperar, na população mais jovem (entre 18 e 24 anos) o Nubank cresceu de maneira ainda mais absurda.
Algumas observações:
1.Todos os bancos tradicionais perderam share, com destaque para Banco do Brasil, Caixa, Bradesco e Itaú que perderam quase 50% de share neste período.
2. Mesmo nessa faixa etária, outros bancos digitais ainda não conseguiram se destacar, com exceção do Banco Inter que alcançou 14%, ultrapassando todos os bancos tradicionais.
3. A grande pergunta é: o que acontecerá à medida que a população atualmente nessa faixa etária for envelhecendo? Elas irão migrar suas contas para bancos tradicionais buscando mais segurança e serviços, ou continuarão fiéis aos bancos digitais?
Eu acredito que: uma vez que você vivenciou uma excelente experiência de usuário como a do Nubank, sem ter que pagar tarifas bancárias por isso, dificilmente você irá migrar para um banco com defasagem tecnológica, que cobra tarifas abusivas e que costuma ter uma péssima experiência do usuário. Por mais que bancos tradicionais estejam correndo para se atualizarem, acredito que farão isso de maneira mais lenta do que bancos digitais.
Simplificando: do ponto de vista do cliente, pode ser que bancos tradicionais estejam 2 vezes melhores daqui 5 anos, o problema é que o Nubank, provavelmente, estará 10 vezes melhor.
Abaixo vocês conseguem ver os gráficos com outras faixas etárias e que, na minha visão, deixam claro que é só uma questão de tempo para que os bancos tradicionais sejam ultrapassados por bancos digitais.
Neste último gráfico de faixa etária, com recorte da população acima de 51 anos, um dado interessante:
O Nubank parece ter demorado para se tornar relevante para essa parte da população – em dezembro de 2018 tinha apenas 3% de share. Entretanto, em 2019, seu crescimento nessa faixa etária foi enorme, saltando para 13% ao final do ano, superando o Bradesco e Santander.
Análise por classe econômica
Esse gráfico me surpreendeu bastante. Eu ainda acho o Nubank muito limitado em termos de serviços para clientes de alto poder aquisitivo. Porém, o gráfico mostra que essa parcela da população também está migrando para o banco. Nesse recorte, o Banco do Brasil, Caixa e Santander são os bancos que mais perderam share.
Seguem os gráficos de outras classe econômicas:
Algumas observações:
1. O Nubank ganha share de forma consistente em todas as classe econômicas;
2. O Banco Inter ganhou destaque na classe econômica E, de renda declarada de até R$1255, ficando atrás somente da Caixa e do Nubank;
3. Os bancos tradicionais privados caminham para se tornarem insignificantes para as classes mais baixas. Na minha visão, isso é um péssimo sinal para eles uma vez que é nesta parte da população que existe o maior potencial de crescimento nos próximos anos.
Análise por região do país
Algumas observações:
1. Nubank cresceu em todas as regiões do país, apresentando um desempenho melhor no sul do país e um resultado bem pior no norte.
2. Apesar do forte crescimento do Nubank, o Itaú ainda é maior na região Sudeste, mas fica fora do TOP3 em todas as outras regiões.
2. Bradesco e Caixa ganharam muito share na região norte.
3. Itaú perdeu mais share na região sudeste, justamente onde é mais forte.
4. Os bancos estatais ainda se mostram fortes nas regiões Norte e Nordeste. No Norte, Caixa e Banco do Brasil somam mais de 40% do share dentre os resgates dos usuários do Méliuz. No Nordeste, a soma dos dois grandes bancos estatais ultrapassa 50% dos usuários.
Conclusão
Já tem um tempo que acompanhamos a evolução meteórica do Nubank com bastante interesse. Um mercado oligopolizado, prestando um serviço caro e ruim para seus clientes era o cenário perfeito para uma boa startup crescer e ganhar share com velocidade.
No final de 2018, a gente chegou a se questionar no Méliuz se ainda havia espaço para novas soluções no mercado financeiro. Decidimos testar e lançar, em parceria com o Banco Pan e com a Mastercard, um cartão de crédito que oferece cashback. Estávamos preocupados porque sabíamos que o mercado já estava competitivo, com Nubank, Inter, Neon, Next, Original, oferecendo soluções sem anuidade aos consumidores. A gente estudou muito e planejamos com cuidado esse piloto e, por isso, sabíamos que mesmo nesse cenário de competição tínhamos grandes chances de apresentar um bom resultado – ainda assim, ele nos surpreendeu muito e de forma positiva.
Mesmo sendo um piloto, a demanda pelo nosso cartão subiu de forma exponencial, como vocês podem ver no gráfico abaixo, e conseguimos converter clientes de todos os bancos, inclusive do Nubank e do Inter. Os números de cartões ativos e recorrentes e nosso NPS acima de 75 também se mostraram muito acima da média do mercado.
Os dados desse teste e de todos os gráficos que apresentei acima nos levaram à conclusão de que:
Sim, ainda existe muito espaço para inovar e crescer no setor financeiro brasileiro!
A fórmula para crescer é simples: foco no consumidor. A execução por sua vez é complexa e exige uma cultura totalmente distinta da cultura enraizada nos bancos tradicionais.
Estamos muito animados com o que vem pela frente! Assim como Pagseguro e Stone fizeram uma revolução no setor de adquirentes, destronando Cielo, Rede e Getnet, e a XP fez no setor de investimentos, queremos fazer parte das startups que irão revolucionar todo o serviço financeiro do Brasil. Obviamente que o cartão é só nosso primeiro passo nesse universo, mas tenho certeza que, junto com outras startups, ainda vamos gerar muitas mudanças positivas para a população brasileira.
obs 1: se você é sócio ou trabalha em um desses grandes bancos tradicionais, não fique bravo comigo. Vocês são profissionais do mais alto nível e têm total capacidade de reverter esse cenário.
obs 2: se você trabalha no governo, é deputado ou senador, privatiza logo o Banco do Brasil antes que ele não tenha mais valor rs. (essa é uma opinião pessoal minha, e não do Méliuz)
* Lucas Marques é COO e sócio do Méliuz. Formado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Minas Gerais, Marques entrou na Ambev como trainee, onde trabalhou por três anos. Ele foi gerente de vendas e de marketing, e no seu último cargo foi responsável por Copa do Mundo e plataforma Futebol. Atualmente é COO no Méliuz, onde é responsável por Gestão, Cultura, Gente, CS, Comercial e Operações do Varejo Físico.