* Por Daniel Lugondi
Há algum tempo me esforço para compartilhar alguns dos aprendizados que tive nos últimos 4 intensos anos dentre os quais tenho conseguido, a duras penas, colocar em prática toda a teoria absorvida a partir do mestrado no qual me dediquei aos estudos da Gestão da Inovação.
Invariavelmente, a forma pela qual eu vinha executando esse compartilhamento eram por meio de palestras em eventos ou ainda nas aulas que leciono em algumas universidades, o que nem sempre permite que essas experiências toquem outros públicos que não aqueles ligados a comunidade da qual faço parte, quase que prioritariamente, designers. Ideia nada original, penso eu, não fosse o fato de que no instante exato em que escrevo este texto me encontro em quarentena por conta da pandemia por covid-19 que assola o planeta.
Sendo assim, escolhi contar em forma de artigo as partes que julgo serem mais pertinentes para aqueles que enfrentam um desafio similar – estabelecer um mecanismo de gestão da inovação – em empresas que, muito provavelmente, não se importam muito com isso, quer seja por falta de conhecimento ou por subestimar este ativo como vantagem competitiva nos negócios.
“Many characteristics once believed to reflect innate talent are actually the result of intense practice”
Afinal, como está descrito em The Role of Deliberate Practice in the Acquisition of Expert Performance, muitas características que antes acreditava-se refletir talentos inatos são, na verdade, o resultado de intensa prática. Inovar não é diferente.
Em 2016, deixei a empresa na qual trabalho atualmente – Locaweb – para me dedicar prioritariamente ao mestrado e, de lá pra cá, muita água passou por debaixo da ponte. Em paralelo, nessa nova empreitada, me dediquei a evolução de uma startup sendo responsável pela evolução do time em termos organizacionais – definição de papéis, atuação, gestão de times, priorização e definição de releases – assim como a estruturação de um novo paradigma no modelo de interação nas ferramentas ofertadas pela empresa a partir de uma orientação centrada nos usuários, privilegiando, portanto, a colaboração entre os times para se conceber soluções mais alinhadas ao desejo do cliente.
Depois de quase 1 ano e meio de trabalho ao lado de empreendedores altamente resilientes, capazes, sempre dispostos a aprender e evoluir, foi hora de deixar o modelo growth/scale up para me aventurar em águas ainda mais turbulentas, quando a empresa está em declínio iminente.
Logo em seguida – não sei como poderia ocorrer algo do tipo – duas empresas do setor de Telecomunicações me procuraram e ali encontrei a possibilidade que há tempos perseguia, desenvolver, ou mesmo participar, da concepção e condução de um modelo de gestão da inovação. Acabei optando pela Nextel, que se encontrava em um cenário de declínio no que tange seu Business Life Cycle naquele momento, e não poderia estar mais certo da minha escolha, uma empresa nesse estágio tem sede, tem fome, ela luta pra sobreviver. Em outras palavras, um cenário que muito mais facilmente vai se interessar por mecanismos que a favoreçam estabelecer quaisquer vantagens competitivas a curto prazo.
Uchikomi – a prática leva a perfeição
Além de perceber o momento da empresa na qual você aportou o conhecimento, penso que outro fator a ser, fundamentalmente, percebido seja o status quo da maturidade em inovação para que se possa realmente garantir o melhor encaixe de cada iniciativa. O importante é que a inovação precisa ter seu lugar na estratégia da empresa, como ativo que é, face à concorrência. Sendo assim, se estabelecer um ambiente compatível para a prática disciplinada será preponderante para o sucesso (ou fracasso) nesta empreitada.
Algumas empresas afirmam que adotaram uma atitude do tipo “experimentar e aprender”, mas na realidade não implementaram muita disciplina na parte “aprender” da equação, como bem demonstra o Profº Vijay Govindarajan em um de seus livros. Na verdade, deixaram o aprendizado para intuição e a opinião. De fato, em alguns poucos contextos e muito limitados, esse movimento pode até ser apropriado, isto é, quando a natureza do experimento é tal qual rende um retorno rápido, claro e unidimensional, as lições aprendidas são diretas e a intuição é suficiente.
Desta forma, em um cenário de incertezas, novos entrantes e certamente, imponderáveis como o cenário de pandemia atual, o melhor caminho a ser adotado é da prática disciplinada e, neste sentido, me lembro bem dos meus primeiros treinos de judô, onde em determinada parte do treino repetimos exaustivamente as técnicas, este momento era chamado Uchikomi. Não existe uma tradução específica para o termo, mas eu me atrevo a dizer, por meio do exemplo do Rogério Sampaio – judoca brasileiro medalha de ouro em Barcelona, 1992 – que a prática leva a perfeição (não deixem de ver o documentário da trajetória dele).
Pois bem, isto posto, antes mesmo de se meter a criar uma estratégia megalomaníaca eu posso dizer que, na minha experiência, o caminho adotado – e com certo sucesso – foi convencer o alto escalão da companhia de que a prática disciplinada renderia frutos e que esses frutos não seriam exatamente o mesmo esperado, e praticado, em uma operação comum onde prazos, orçamento e especificações tem seu lugar. Em vez disso, estamos nos referindo a uma melhoria na exatidão das previsões, isto é, o “aprender” significa fazer melhores previsões.
Como gosto de lembrar a essas lideranças, nossa função é, com o passar do tempo, transformar suposições aleatórias em previsões confiáveis. Isto nos traz uma lógica muita clara, com previsões melhores, você toma melhores decisões, e quando você toma melhores decisões, consegue melhores resultados. Sem este buy-in eu diria que muito provavelmente seus esforços não serão recompensados e suas atitudes e iniciativas poderão soar como insubordinação ou que você adotou um pet project, pois é assim que máquina da operação e repetição percebe uma anomalia no processo produtivo.
* Daniel Lugondi é gerente de Inovação e Design da Locaweb. É mestre em Engenharia de Produção com foco em Gestão da Inovação e Empreendedorismo. Especialista em Design de Interação. Graduado em Design Gráfico, com extenso conhecimento no mercado de tecnologia e desenvolvimento de softwares. Nos últimos 15 anos, trabalhou em grandes empresas, como Bradesco, Mapfre, Nextel, Locaweb, entre outras – projetando melhores experiências, processos e resultados por meio da abordagem do design-driven innovation.