* Por Adriene F. Pereira
Sou oceanógrafa, formada em um curso de graduação extenso de cinco anos, sem uma única disciplina voltada ao empreendedorismo ou à inovação. Como não venho de uma família de empreendedores, o mundo dos negócios era algo completamente desconhecido e fora da minha realidade.
Embalada pela formação da graduação, segui na vida acadêmica até concluir o pós doutorado. Foram 10 anos dedicados aos estudos e à pesquisa, tendo consciência de que não tinha o perfil para me tornar professora universitária, ou seja, permanecer na Academia.
No meio do pós-doutorado, recebi o convite de colegas para assumir a posição de sócio administradora da HidroMares, uma empresa que, na época, existia no papel e com sede no endereço residencial de um dos sócios. O desafio era grande: abrir um escritório em Santos (SP) e começar a angariar serviços ativamente, além daqueles obtidos de forma passiva pelos, então, sócios.
Aceitei o desafio. Hoje, tenho consciência que não sabia o tamanho dele. Mas a ignorância, às vezes, é uma aliada no sentido que não permite que a mente já crie barreiras, algumas, até imaginárias. Afinal, se o desafio foi aceito, agora, é partir para concretizá-lo.
De lá para cá, já se passaram um pouco mais de 15 anos. A empresa cresceu e se consolidou com muito esforço, dedicação, técnica e, sim, com alguns golpes de sorte como estar no local certo e no momento certo.
Inovamos na aplicação da Oceanografia no setor portuário, utilizando IoT para criar o sistema de monitoramento meteo-oceanográfico em tempo real e IA para realizar previsões dos mesmos parâmetros.
Mas é inevitável me perguntar o quanto poderíamos ter evoluído mais rápido e sem tantas dores se conhecimentos básicos de como empreender e inovar tivessem sido fornecidos desde a educação básica até a graduação de todos que de alguma forma contribuíram para tal consolidação. E quanto mais poderíamos ter usado da nossa jovem criatividade, já que estudos indicam que uma das fases em que somos mais criativos é na faixa dos vinte e poucos anos, para criar se inovação fosse tema recorrente na nossa educação formal em salas de aula?
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Educação empreendedora no Brasil
No Brasil, não somos educados para inovar e empreender em bases sólidas. Sendo nossos representantes um espelho da sociedade, a falta dessa consciência é refletida em nossos governantes, fazendo com que tais temas não sejam assuntos prioritários na agenda de Governos.
A recente Medida Provisória nº 1.136, de 29 de agosto de 2022, é uma clara sinalização dessa postura, limitando o uso de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, principal fonte de financiamento à inovação no país. Ao longo de 2022, R$ 5,555 bilhões poderiam ser aplicados, R$ 3,5 bilhões a menos do inicialmente previsto. A partir do ano que vem, a medida estabelece uma porcentagem de aplicação que chegará em 100% dos recursos só em 2027.
Além da dificuldade de linhas de financiamento, contrassensos jurídicos como a Lei do Bem são frequentes. Essa lei promove concessões de incentivos fiscais a empresas que inovam. Entretanto, só pode ser aplicada por empresas tributadas no lucro real e não, no presumido, sistema no qual a maioria das jovens empresas e startups estão enquadradas.
Coincidência ou não, a maioria das empresas listadas como mais inovadoras no Brasil pelo anuário 2022 Valor Inovação Brasil são empresas de grande porte e muito bem consolidadas como Nestlé Brasil, Vale e Embraer.
Estamos dentre as nações menos competitivas do mundo de acordo com a Escola de Administração de Lausanne, na Suíça. Em 2022, ficamos na posição 59ª dentre 63 países e perdemos pontos em quesitos ligados à inovação como qualidade de mão de obra e desenvolvimento tecnológico. E, assim, voltamos, novamente, ao tema inicial dessa reflexão: educação.
O Brasil precisa de uma mudança de postura sobre o tema se desejamos criar uma sociedade com mais oportunidades profissionais além daquelas decorrentes da clássica formação universitária, com fomentação à inovação nas jovens mentes criativas e com novos empreendedores assumindo menores riscos via aplicação de conhecimentos básicos. Precisamos formar essa cultura.
Só assim teremos, no futuro, tomadores de decisão conscientes da importância de incluir inovação e empreendedorismo, em especial, o tecnológico como assuntos principais em uma agenda de Governo.
Adriene F. Pereira é formada em Oceanologia pela Fundação Federal do Rio Grande. Atualmente é Diretora Exutiva da empresa HidroMares Oceanografia, Consultoria e Equipamentos.
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