* Por Daniela Coelho
A infestação do coronavírus instalou um clima de tensão que presenciamos quando grandes crises assolam a humanidade. O medo de um contágio faz com que a sociedade e as empresas mudem suas rotinas. A repercussão é gigantesca e a situação de insegurança é crescente. Companhias como McDonald’s e Starbucks anunciaram o fechamento de parte de suas lojas na China. Algumas empresas estão retirando expatriados das áreas mais críticas. As companhias aéreas estão suspendendo voos para o país e até a indústria de entretenimento sente os impactos com o fechamento de cinemas e parques nas regiões próximas afetadas.
Mas eventos relacionados a riscos à saúde e surtos em grandes proporções não são os únicos fatores que podem impactar o mundo dos negócios de forma drástica. Desastres naturais, guerras e terrorismo também geram preocupação e trazem impactos crescentes à medida em que as cadeias de suprimentos estão mais complexas e interdependentes. Podemos exemplificar com o Tsunami de 2011, que ocorreu no Japão, mas que trouxe demissões de funcionários de uma montadora no Brasil e redução da produção por falta de peças.
A cidade de Wuhan, considerada o epicentro do novo coronavírus, possui mais de 500 fábricas e outras instalações. A região precisou ser isolada e não há perspectiva sobre a duração dos bloqueios. Também, não se sabe em que condições os trabalhadores voltarão aos seus postos de trabalho, seja pelas questões do feriado do Ano Novo Chinês ou por estarem infectados. Assim, mesmo que as empresas retomem à operação, a produtividade certamente será reduzida. E haverá impacto em outras companhias que se relacionem com as operações desta região.
Empresas que possuem uma cadeia de suprimentos global de alta complexidade, precisam reagir rapidamente a esses eventos. Muitas delas têm estratégias de diversificação de fornecedores, aumento da capacidade de armazenagem, crescimento dos níveis de estoque e revisão da alocação de suas operações. Adicionalmente, muitas utilizam softwares de monitoramento global, que permitem receber tendências e alertas tão diversos como volatilidade de preços de commodities, alertas de furação ou fechamento de portos. Sabemos, entretanto, que a grande maioria ainda opta por uma postura reativa, mobilizando uma grande força tarefa quando essas situações ocorrem, sem perceber que perdem um tempo precioso pela falta de preparo.
Um case que ocorreu há alguns anos, mas que pode servir de exemplo por sua magnitude foi o ocorrido em New Orleans com o furacão Katrina, que devastou a cidade. Já tentando minimizar os prejuízos prováveis, algumas empresas se anteciparam e implantaram planos de emergência para garantir a continuidade das operações e a segurança de seus funcionários. Pode-se citar o caso da P&G, que transferiu os seus estoques para outro local, adiantou salários para funcionários, realizou ações junto aos varejistas para proteger o seu espaço de prateleira. Com isso, pode retomar as operações da planta três semanas depois do furação e alcançar praticamente os mesmos volumes distribuídos em relação ao ano anterior
Para se anteciparem a situações de crise, cabe às empresas mapearem possíveis cenários de ruptura, avaliando os impactos aos negócios e probabilidade de ocorrência. A visão integrada deve ser considerada, analisando toda a cadeia e não somente acontecimentos pontuais. Diariamente, ocorrem eventos de toda natureza com uma frequência cujas dimensões não conhecemos e não conseguimos mensurar. É fundamental definir as possíveis estratégias de contingência, que se mostrem viável economicamente, mas que também suporte a sua presença no mercado e a segurança dos stakeholders. Não se pode esquecer de realizar simulações e testes para verificar sua efetividade e necessidade de ajustes.
No caso que estamos presenciando em função do coronavírus, algumas ações rápidas podem ser assumidas pelas companhias, como:
– Identificar se possuem fornecedores nas áreas que estão sendo afetadas e definir um plano de abastecimento, considerando inclusive o aumento dos níveis de estoque;
– Verificar se seus funcionários possam ter sidos expostos ao vírus e oferecer alternativas de trabalho remoto. Além disso, realizar comunicações educativas para esclarecimento da situação.;
Reforça-se que as empresas não devem esperar serem surpreendidas pelas crises para se prepararem. E que não somente os grandes eventos globais merecem atenção. Em nosso país, são inúmeros os casos de acontecimentos que geram interrupções. Enchentes e deslizamentos ocorrem com grande frequência, atingindo grande parte das cidades brasileiras, causando mortes, destruição e perdas financeiras.
Durante o desenvolvimento deste artigo, a OMS declarou emergência global por conta do coronavírus. Fazendo um paralelo com o que estamos tratando neste texto, podemos incluir uma dica adicional em relação como as empresas devem responder a situações de crise. É importante que as ações de continuidade e contingência sejam planejadas de acordo com o grau de criticidade. Ou seja, as decisões devem refletir o tempo de interrupção e a evolução do cenário.
* Daniela Coelho é diretora associada de riscos e performance na ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, compliance, auditoria interna, investigação, proteção e privacidade de dados.