* Por Marcio Mantovani
Sou empreendedor, investidor em algumas startups e fundador de uma. Nos últimos anos, tenho acompanhado o processo de crescimento vertiginoso do mercado de startups; recebo centenas de materiais e leio tudo que posso sobre o setor.
Ao longo do tempo, com o desenvolvimento do mercado brasileiro de startups, surgiram empresas interessadas em, de alguma forma, criar um ecossistema que pudesse congregar essas startups a fim de ajudá-las no desenvolvimento de soluções que possam fazer com que o mercado avance – do mesmo modo que o mercado americano.
No passado, muitos destes sistemas – que podemos chamar de incubadoras ou aceleradoras – foram formados com o intuito claro de ajudar estes empreendedores a se desenvolverem e ligar investidores a estas startups, possibilitando que elas crescessem e se tornassem unicórnios.
O mercado de startups se desenvolveu e surgiram soluções incríveis e mais de uma dezena de unicórnios (muitos inflados pelos fundos investidores, que investem para a valorização da sua própria cota, mantendo seus investidores felizes e aplicados nos próprios fundos, mas este é assunto para outro artigo).
Mas, como em todo mercado, começou a se criar uma bolha. E, como em toda bolha, surgem os oportunistas.
Muitas empresas grandes passaram a participar de eventos como patrocinadoras de incubadoras e aceleradoras e, consequentemente, a conhecer as iniciativas de perto.
Os empreendedores, empolgados, passaram a dar informações sobre seu negócio – desde a sua criação (seus diferenciais etc.) – pensando estar, de alguma forma, vendendo sua ideia a esta multinacional.
Ocorre que, em muitos casos, a grande empresa tem apenas o interesse de buscar insights para seu próprio negócio e, às vezes (não raro), copiar e implementar a ideia.
“Ah Marcio, mas por que uma empresa faria isso?” A pergunta deveria ser outra: “Por qual motivo você está apresentando seu negócio? O que essa empresa vai agregar à sua startup?” Por isso resolvi escrever algumas dicas para as startups na relação com incubadoras/aceleradoras e grandes companhias:
1) Se possível, desenvolva seu negócio antes de estar dentro de uma estrutura grande.
Se seu projeto ainda é um embrião, onde você e seus sócios estão iniciando o projeto, não compartilhe sua ideia. Existem milhares de startups, e quase todas as ideias estão sendo aplicadas por alguma delas. Portanto, não compartilhe/divulgue sua ideia antes de amadurecê-la.
2) Só participe de processos de aceleração se seu negócio depender disto para sobreviver.
O que é oferecido na grande maioria das vezes em uma aceleradora soma menos de mil reais por mês, e a “mentoria” prometida não é, muitas vezes, relevante. A abertura da sua ideia para concorrentes e grandes empresas do seu setor, antes dela estar consolidada, é um risco que você deve evitar.
3) Dar palestras para startups concorrentes não é inteligente.
Muitas vezes você será convidado para falar do seu negócio e fará muitos pitchs para investidores. Só que, neste local, terá centenas de concorrentes e empresários ávidos por boas ideias. Se você ainda está engatinhando, por que este empresário faria isto com você se pode fazer sozinho?
4) Não se iluda com o mercado: ele é cruel!
Muitos empreendedores são sonhadores e estão sempre acreditando em tudo que os levem a pensar que seu negócio prosperará. Você encontrará muita gente boa no caminho, mas, na grande maioria das vezes, encontrará mais lobos.
5) Estude muito antes de se aventurar como startup.
Não adianta uma ideia incrível se ela não é exequível. Pesquise se ninguém já está fazendo isto no mercado e, se alguém já o está, pesquise qual o grau de sucesso deste negócio.
6) Cuidado com capital financeiro, ele acaba rápido.
Muitas startups esquecem que nas primeiras rodadas o objetivo é tornar o projeto viável. O famoso “Excel de projeção de vendas e crescimento” muitas vezes se torna ilusório e o capital projetado vai muito mais rápido do que você pensa. Por isso, busque, além do capital financeiro, o capital intelectual e, principalmente, networking. Entenda se o investidor ou fundo fará o seu negócio chegar realmente em outro nível, quais portas eles irão te ajudar a abrir, quem participará das reuniões de alinhamento etc. E só aí definir se estas pessoas que vão agregar no seu negócio. Definindo o investidor, não deixe de aproveitar tudo que ele pode te oferecer porque dificilmente ele vai bater na sua porta para te trazer o que você precisa – por isso, desenvolva a habilidade de identificar quem vai te ajudar e como você colherá o que precisa de cada investidor. Lembre-se que ele será seu sócio e, portanto, tem interesse no seu sucesso.
7) Cuidado com o “apalavrado”; tenha um bom advogado para te auxiliar.
Na empolgação de ter conseguido um investidor, tudo parece maravilhoso. E normalmente neste “namoro” é possível fazer tudo. No entanto, se atente em documentar tudo o que foi combinado para evitar o conflito e desconforto após uma ter uma entrada de capital e um investidor ao seu lado. Eu já vivi esta experiência como empreendedor e posso te garantir que não é nada boa.
É importante que você entenda que nada disso é um impeditivo para empreender, mas é necessário compreender como o mercado funciona fora do PPT.
Alguns questionamentos importantes devem ser avaliados antes de você se aventurar como empreendedor:
- Quem já está executando minha ideia? De que adianta você montar uma empresa que vai ligar o motorista de carro ao cliente se já existe o Uber?
- Qual é a dor que a minha ideia vai curar? Isto é relevante?
- É possível fazer isto que eu estou criando de forma escalável e com lucratividade?
- Qual o tamanho do mercado que meu produto vai atender?
- Quando eu chegar no meu limite de crescimento, esta empresa terá lucro?
- Quanto capital e quem vai financiar meu crescimento? Por quanto tempo?
Se você conseguir entender estas questões, siga em frente.
Não se iluda com a valuation do mercado.
Muitas empresas são avaliadas em alguns milhões ainda no PPT, mas isso não significa que o fundador recebeu algum dinheiro: significa, apenas, que é uma ideia factível e que, se for bem executada, poderá multiplicar o capital do investidor em algumas vezes. Todo o capital, também, será usado para viabilizar a transformação da ideia em um negócio e, em muitos casos, pela falta de experiência do fundador, ele acaba sem nada e sem o negócio.
Então pé no chão e muito trabalho!
Marcio Mantovani é CEO do Clude e investidor em startups.