* Por Bruno Cecatto
Você deve ter lido bastante sobre as perspectivas do nosso planeta para o tão esperado pós-crise. E – infelizmente – o impacto social, econômico e estrutural que vamos viver já possui previsões catastróficas e nenhuma ainda muito precisamente calculada.
Sob a perspectiva econômica – mais especificamente nas profissões que passarão a sofrer num mundo em recessão – o cenário não é nada bom para áreas como de vendas, marketing, relacionamento e tudo impactado pelo desenvolvimento de negócios.
Contudo, há um tipo de profissional que mesmo passando por esta tempestade, parece possuir melhores perspectivas, o engenheiro de sistemas. Mais ainda, uma versão dele que gostaria de falar mais a respeito nesse texto: o engenheiro 10x. Faço uso do gênero masculino para simplificar, mas inclui engenheiras, óbvio. A propósito, numa próxima coluna, vou escrever especificamente sobre engenheiras.
A engenharia de sistemas é uma profissão que sempre teve um nível muito baixo de desemprego: abaixo de 1,0%. Apesar de já ser uma profissão cobiçada em vários lugares do mundo (muito inspirado pelo vale do silício), a bolha da internet praticamente desenhou a grande demanda por engenheiros que vemos hoje.
De acordo com a Evans Data Corporation, existem cerca de 27 milhões de desenvolvedores ativos no mundo, e pouco antes da crise da covid-19, o setor já podia facilmente incorporar o dobro eu diria. Com o crescimento frenético de empresas cujo maior recurso é tecnologia, gerou-se uma corrida frenética nessa área para encontrar talentos. Ainda mais, para encontrar o melhor talento possível.
Muitos profissionais de programação saberiam colocar melhor do que eu (meu background é business), mas quando se fala em desenvolver ou programar, é fácil concluir que um profissional que é “muito melhor” que outro tem um impacto excessivo na produtividade de uma organização. No Vale do Silício, em particular, o termo “engenheiro 10x” é usado para se referir a esse tipo de pessoa.
Em tecnologia, e mais precisamente em startups que passam por fases críticas embrionárias (virar ou não virar) enfrenta-se muitos problemas técnicos. É aí que um engenheiro 10x faz a diferença. E não é porque trabalha 10 vezes mais que do os outros, mas sim porque tem o impacto de 10 engenheiros.
Por meio de muita prática e foco dedicado no que faz, apresenta as habilidades e conhecimentos para contribuir de maneira equivalente a 10 bons profissionais. É essa pessoa que sempre encontra uma maneira de resolver os problemas mais difíceis, faz toda a equipe crescer e às vezes até parece um mágico.
Se você não escreve código, isso pode parecer um exagero, no entanto, todo desenvolvedor que está lendo isso sabe exatamente a quem estou me referindo e eles estão pensando nesse momento nos poucos engenheiros incríveis que tiveram a sorte de conhecer.
Agora pense numa indústria que já demandava o dobro dos engenheiros que existiam no mercado. Mesmo sofrendo uma redução com os impactos do vírus, que equipe ainda não vai ter espaço para uma pessoa que pode acelerar qualquer direção de crescimento em 10 vezes?
Eu tive a oportunidade de conhecer alguns desses notáveis profissionais e – ao fazer muitas perguntas – pude perceber que os principais motivos para pertencer a uma empresa acabavam se repetindo:
Pessoas boas conhecem pessoas boas
Essa é a chave número um para contratar os melhores engenheiros. Muitos deles se conhecem. Como criar código é um trabalho intrinsecamente colaborativo, quanto melhor a equipe, melhor o trabalho.
Quando os engenheiros mais capazes são entrevistados, em geral, querem avaliar se vão conseguir trabalhar com os melhores. Mais do que o tipo de tecnologia, benefícios ou mesmo remuneração, quem faz parte da equipe é um dos principais critérios.
Usando a analogia do futebol, suponha que você seja um grande jogador de futebol e possa fazer parte do Real Madrid, ou jogar na série de futebol colombiana B, qual você iria preferir?
As tecnologias importam, o impacto importa ainda mais
É verdade que as tecnologias são importantes. Todo engenheiro deseja trabalhar com as mais recentes linguagens e ferramentas de programação, porque são melhores, podem ter maiores funcionalidades ou eficiências e, além disso, são produzidas pelas gigantes (Go pelo Google, React pelo Facebook, por exemplo). Contudo, o impacto que o trabalho tem também é um dos fatores decisivos.
Nas palavras de uma de nossas engenheiras, o impacto é definido como:
– Ter o contexto de porquê fabricamos os produtos que fabricamos para pensar além, em vez de realizar mini tarefas semana a semana, sem ter uma perspectiva completa de onde estamos indo;
– Ter grandes responsabilidades onde o sucesso (ou fracasso) de uma iniciativa é pelo meu trabalho e pela minha equipe;
– O impacto dentro da empresa também é ter total confiança em levantar a mão quando algo dentro da empresa não parece certo para mim, não apenas em termos de engenharia, mas também de cultura.
Responsabilidade, contexto, liberdade de criação, esse é o impacto que os melhores buscam, principalmente porque querem ser desafiados e, quando esse não é o caso, ficam entediados e vão embora.
Um bom salário atrai, uma grande cultura mantém
Muitos empresários reclamam que em muitos engenheiros há uma mentalidade levemente mercenária, de procurar a empresa que paga mais, e há alguma verdade nessa reclamação. O motivo não é que eles sejam “mercenários”, mas a consequência da atual oferta e demanda do mercado.
Aqui, a baixa oferta é combinada devido à falta de engenheiros e a demanda chega de todos os lugares: desde scale-ups como Nubank ou Rappi, startups como nós da Truora, fábricas de software e todas as empresas que são fazendo uma transformação digital. Todos nós precisamos de desenvolvedores.
Nesse ambiente, haverá melhores ofertas econômicas constantemente. Se um desenvolvedor é um dos melhores (e isso também se aplica a quem não é), ele certamente será tentado por uma remuneração maior. A menos que você esteja absolutamente motivado pelo tipo de trabalho que realiza, a grande equipe e uma cultura em que se sente parte, você pulará para outro emprego.
Embora seja importante ser competitivo no mercado para atrair talentos, você só pode manter a equipe se tiver uma ótima cultura. As empresas que conseguem apenas executar uma dessas ações muito bem tendem a competir apenas com o salário.
Assim como uma empresa da indústria e tabaco precisa pagar mais para que as pessoas se sintam confortáveis vendendo cigarros, um desenvolvedor que precisar trabalhar em tecnologias antigas, com equipamentos regulares, fazendo correções de bugs o tempo todo e em um ambiente pesado, terá que receber um milhão ou não trabalhará lá.
O truque que encontramos nas startups, já que não podemos pagar da mesma forma que o Google, é criar um ambiente de impacto e excelente cultura, mas também oferecer stock options para a equipe. Portanto, eles não apenas têm um senso de pertencer ao amor pelo que fazem, mas também são literalmente proprietários do negócio.
Contratar um engenheiro de 10x ou o “Jogador A” é uma das melhores maneiras de uma equipe e empresa de engenharia crescer, mas, pela grande demanda, não é fácil. Se você é um desses engenheiros, parabéns! Se você estiver interessado em se tornar um, na próxima coluna, vou escrever um pouco sobre o que aprendi com os engenheiros que tive o prazer de trabalhar e aprender.
Bruno Cecatto é empreendedor e co-fundador Brasil da Truora. Passou por empresas como Uber e Nibo – todas em estágio embrionário de desenvolvimento.