Que as startups estão se fomentando nos investimentos não é uma novidade. Só em fevereiro elas receberam US$ 763 milhões ao longo de 40 rodadas de aportes, segundo o Distrito. Mas será que são todas as empreendedoras que entendem sobre o processo de captação?
Para sanar as dúvidas, demos início a uma série de matérias com dicas práticas de importantes investidores e empreendedores do mercado. Eles falam sobre quais investimentos buscar no início da companhia, o que fazer para atrair investidores e como preparar um pitch matador.
Em março, em homenagem ao Dia Internacional das Mulheres, convidamos diversos nomes femininos renomados do ecossistema. Marcella Ceva, CIO do WE Ventures, é a convidada da vez e trouxe dicas exclusivas para as empreendedoras mulheres. O fundo faz parte das iniciativas do Women Entrepreneurship (WE), programa desenvolvido pela Microsoft, que tem como objetivo incentivar o empreendedorismo feminino no Brasil por meio de cursos de capacitação e investimentos para startups fundadas por mulheres empreendedoras.
Por onde começar?
Cerca de 55% das mulheres brasileiras empreendem por necessidade de obter renda, segundo o relatório Global Entrepreneurship Monitor (GEM) de 2020, e poucas são aquelas que seguem esse caminho por oportunidades do ecossistema, de acordo com Marcella.
Nesse sentido, elas precisam estar preparadas para buscar a captação necessária para alavancar o negócio. Uma dica é saber muito bem sobre o seu business, métricas, dados principais, além de saber explicar de forma clara o motivo pelo qual está captando dinheiro.
Segundo dados do Investor LATAM, apenas 8% dos investimentos financeiros são destinados ao empreendedorismo feminino, por isso Marcella destaca “as empreendedoras precisam estar bem mais preparadas e saber informações sobre o seu negócio e o mercado. É claro que não tem problema nenhum não saber tudo, mas é importante ter as respostas na ponta da língua para os questionamentos que podem ser feitos”. A dedicação redobrada permite que a empreendedora faça parte dessa pequena porcentagem e mude os viesses enraizados no ecossistema de inovação.
Para fazer uma captação também é fundamental avaliar os players do mercado que atuam em cada estágio de investimento. “Não adianta bater na porta de um player que faz série B, se você está levantando o primeiro cheque, pré-seed ou seed”. Geralmente o primeiro investimento de uma startup é o FF, friends and family, ou seja, amigos e familiares, que têm interesse em contribuir no início do negócio, junto aos investidores-anjo – empreendedores, líderes de negócio e pessoas físicas.
Depois você pode olhar para o capital semente – seed, pré-seed e série A, também chamado de cheque institucional. “A empreendedora precisa ter em mente que não deve abrir mão demais do capital dela, porque no momento que buscar uma série A ou série B, ela vai estar super diluída. Os fundos acabam não investindo dessa forma e não entendem porque ela optou por não pegar capital em rodada early”, explica Marcella.
O termo “diluição” no mercado de trabalho pode ser definido como a diminuição de percentual ou do valor das quotas ou ações do negócio. O titular prejudicado pode perder o seu poder de decisão, administração e recebimento dos dividendos.
Trajetória
Marcella é carioca, nasceu no Rio de Janeiro, mas fez sua carreira em São Paulo no mercado financeiro, também conhecido como um ambiente extremamente masculino. Foram sete anos trabalhando no G5 Partners, banco de investimentos, onde era responsável por fazer os M&A – fusões e aquisições – e adorava a função.
Depois que saiu do setor, recebeu diversas propostas para voltar, mas nada despertava seu interesse e o brilho no olhar que tinha no início da profissão. Em novembro de 2019, ela recebeu o convite para o WE Ventures, mas na época seu filho tinha 5 meses, ela ainda o amamentava, e a resposta foi definitivamente um não.
Os meses foram passando e ao perceber a importância do projeto, aceitou o convite. Marcella começou a trabalhar no WE Ventures em fevereiro de 2020 como Chief Investment Officer. Esse momento, segundo Marcella, foi o mais marcante de sua carreira. “Venho de uma carreira do mercado financeiro onde eu trabalhava longas horas todos os dias da semana, sábado, domingo, feriado, não tinha férias há anos, então foi um choque muito grande e tive que me adaptar para voltar, porque agora, tinha um adicional, eu era mãe”, compartilha.
Para Marcella, seu pilar mais importante na vida era o trabalho, mas isso mudou logo após o nascimento de seu filho. “A prioridade hoje é o meu filho antes de qualquer outra coisa. Foi muito difícil me adaptar, porque tenho um nível de exigência com o meu trabalho muito alto. Tive que reaprender a dividir o meu tempo, aceitar sem culpa que preciso deixar meu filho com a babá ou agora na escola, ou qualquer outro lugar, para trabalhar”.
Marcella sentia culpa por não estar ao lado do filho o tempo todo, mas teve que entender que isso era necessário para manter sua carreira. “Foi um período importante de forma positiva e negativa. Me transformou numa profissional diferente, foi muito difícil, mas também foi muito marcante”.
Pitch matador
Como a investidora já mencionou, a empreendedora precisa estar preparada, principalmente porque mulheres têm jornadas quádruplas e são responsáveis por diversas funções – casa, família e talvez um outro trabalho rentável que soma com o empreendimento -, além de que enfrentarão uma mesa muitas vezes repleta apenas de investidores homens.
“Ela precisa estar muito bem preparada porque esses homens, também estatisticamente, têm viés inconsciente e fazem perguntas pejorativas para as empreendedoras. Tenha na ponta da língua o básico da sua empresa”.
Marcella também destaca a importância de saber ouvir o “não” e as críticas. “Receba o feedback, seja bom ou ruim, e implemente em seu negócio. Quando você retornar a conversa com os investidores e mostrar seu pitch com as mudanças apontadas por ele, o fundo geralmente terá um olhar positivo para o seu projeto.”
O que um investidor busca
O WE Ventures é mais do que apenas um financiamento, o fundo oferece conexões entre todas as suas investidas e grandes corporações, como consultorias especializadas, ganhos de escala, mentorias e acesso a ambientes de inovação, tudo para fomentar o ecossistema de inovação feminino no País.
Sua tese de investimento são startups de base tecnológica, com pelo menos 20% de capital feminino e mulheres em cargos de liderança. “Queremos ter certeza que o capital chegue às mãos de mulheres. Elas como protagonistas e na liderança é o nosso objetivo”. O fundo também investe em empresas que já estejam tracionando e tenham pelo menos um primeiro cliente, gerando faturamento mínimo de R$ 500 mil ao ano.
A sinergia com os investidores ou âncoras, como Marcella costuma chamar, é um ponto buscado pelo WE, porque assim as chances de ocorrerem aportes de inteligência e com cheques robustos, são altas.
Além disso, o WE procura negócios que tragam diversidades regionais, econômicas e que gerem impactos positivos na sociedade. “Gostamos de investir fora de São Paulo, buscamos por diversidade regional, empreendedorismo periférico…Queremos dar realmente oportunidade para todas as empreendedoras do Brasil”, finaliza.
Para conferir a última matéria desta série do Startupi, clique aqui! A última entrevistada foi a Carolina Strobel, sócia operacional da Redpoint eventures.
* Foto destaque: Marcella Ceva, CIO do WE Ventures.
Quer acompanhar de perto todos os investimentos no ecossistema de startups? Siga as redes sociais Startupi e acesse nosso ranking de investimentos do mês.