Com o novo coronavírus, muitos setores da sociedade tiveram que adaptar os seus serviços, sobretudo para o online. A educação, por sua vez, não ficou de fora desta mudança. Inúmeras escolas e universidades pelo país migraram seus conteúdos para a internet, reinventando, em alguns casos, tanto o modo de ensinar quanto a forma de aprender.
“O amanhã da educação”, dentro do Festival Digital Novo Mundo, que terminou nesta quinta (30), debateu como empresas e pessoas devem estar preparadas para esse novo cenário apontado para o ensino.
O aprendizado e a nova educação
Daniel Castanho, presidente do conselho da Ânima Educação, organização educacional privada de ensino superior, ressalta que, mesmo com a questão da pandemia, é visível que o mundo já estava se preparando para entrar em uma década de transformação da educação. “Agora, com a inteligência artificial, a gente vai reinventar a educação como um todo. Assim, ela vai ter muito mais significado. Você vai entender porque você está fazendo aquilo, vai definir o seu percurso formativo”.
Em relação à educação básica, Castanho afirma que o novo modelo educacional proposto deve ir muito além das teorias. “A grande questão é você poder personalizar a educação, dando um significado para cada criança. A escola tem que ensinar empatia, colaboração, aprender a não ter medo do erro. É um momento maravilhoso para desenvolver as habilidades das crianças”, afirma.
Felipe Anghinoni também compôs o debate. Ele, que é professor e fundador da Perestroika e da Sputnik, também concorda com Daniel e afirma que a educação já não era a mesma antes do coronavírus. “Ela já estava mudando e a pandemia foi importante para despertar esse movimento. Eu vejo uma mudança de uns 10 anos para cá”, destaca.
Com o isolamento social, muitos pais passaram a ter mais tempo para ficar os filhos. Ao mesmo tempo, tiveram que adaptar o seu trabalho dentro de casa. Desta forma, Felipe acredita na possibilidade futura de integrar os dois, sem que ambos saiam prejudicados. “Um pouco de trabalho e um pouco ficar com o filho. Dá para ser empresário e cuidar do social ao mesmo tempo”.
Mesmo com as novas tecnologias, ele acredita que os modelos tradicionais de educação vão se manter, mas aposta, principalmente, no papel dos responsáveis pela criança neste processo. “Acho que preservar a educação infantil não vai depender muito dos professores, nem da tecnologia, mas sim, dos pais”.
Outro convidado do bate-papo foi Carlos Alberto Julio, cofundador da Digital House, startup paulista de educação. Ele enxerga que a tecnologia tem modificado o ensino no Brasil, sobretudo em relação às universidades, mas sente falta do mesmo na educação primária. “As plataformas de e-learning já são uma característica do ensino superior, mas eu quero ver isso acontecendo mais e melhor no ensino básico. Como vamos impactar o ensino básico de massa se ele é rastreado no sistema público?”, questiona.
Julio, que trabalha há 40 anos como professor, sugere que para haver uma evolução no sistema educacional, é preciso que os educadores incentivem os alunos a pensar. “Educar quer dizer autoconduzir. Nós, educadores, temos que fornecer aquilo que eles precisam para se libertarem, terem sua autocondução. Como vai pensar no novo sem se questionar? Criatividade é pensar no novo. Fazer o novo acontecer é inovação”, completa. Agatha Arêas, VP de learning experience do Rock in Rio, concorda com o docente e afirma a importância de se trazer o olhar do indivíduo no pensar de novos formatos educacionais.
“Está havendo o nascimento de uma nova identidade social, na qual as pessoas estão se colocando no lugar de responsáveis pela sua própria experiência de aprendizagem. O “vivendo e aprendendo” está entrando cada vez mais na cabeça das pessoas de forma natural, mas acho que a mentalidade está partindo do indivíduo. Essa força intrínseca faz com que ele mude a família, a empresa, e o mercado deve responder a essa demanda”, afirma.
Ela também acredita que a educação já estava mudando, porém, com a pandemia, esse processo foi acelerado. Mesmo assim, afirma que o momento deixará muitas lições. “Não dá pra fingir que nada está acontecendo. Após a pandemia, em que estamos nesse processo working in progress, se estivermos com os nossos sensores ligados, tudo pode trazer algum significado para a gente. Depois desse choque de realidade, alguma sensibilidade maior vai aflorar e a gente vai aprender mais. A reeducação está em tudo e eu acho lindo esse processo”.
As habilidades do futuro são sensíveis
Com as ferramentas digitais, algumas práticas voltadas para a educação acabam sendo menos proveitosas do que aquelas realizadas fisicamente. Hendel Favarin, fundador da Conquer, empresa que oferece cursos presenciais para desenvolvimento pessoal, questiona o modelo de um ensino mais técnico e propõe que haja uma atividade mais dinâmica.
“A gente pode trabalhar em paralelo. O que vai nos diferenciar é a nossa habilidade de sermos humanos. Temos que focar nas nossas habilidades, capacidade de comunicação, criatividade, oratória, vendas… Se você não entende de pessoas, você não entende de famílias, nem de negócios. Isso alavanca todo o profissional da área de educação”, afirma.
Caroline Bucker, fundadora da Idealiza, que trabalha com design thinking e estratégias de inovação, fortalece a questão de se pensar no coletivo e priorizar, sobretudo neste instante, as habilidades emocionais. “Pensar em tudo o que a gente estava precisando desenvolver e praticamente o que a gente não desenvolveu até agora. Quando você coloca uma visão em um time que consegue colaborar, qualquer coisa acontece”. E completa. “O despertar da curiosidade vai ter que ser geral. Está difícil para todo mundo e a gente deve começar a trocar e compartilhar”, afirma.
Por fim, Rosely Boschini, CEO da editora Gente, afirma que o coronavírus trouxe ensinamentos que vão além das mudanças tecnológicas. “Eu acho que essa pandemia antecipou o futuro e está mostrando para nós o quanto a vida estava desinteressante, em todos os aspectos. As coisas só valem a pena quando têm sentido. A gente precisa de um modelo que privilegie corpo, emoção e razão”, destaca.
Ainda de acordo com o CEO, os jovens de hoje são fonte de informação e precisam ter suas habilidades fortalecidas, com foco no futuro. “A gente tem pressa na responsabilidade de fazer a diferença no mundo. O amor que a gente tem pelas crianças exige coragem. A gente pode contar com a iniciativa pública ou privada, mas enquanto isso não chega, vamos fazer com o que tem disponível na nossa família, no nosso quarteirão. Isso me faz sonhar com uma sociedade mais justa, em que homens e mulheres sejam autores de lindas histórias. Mas eu acho que isso só vai acontecer se cada um colocar a mão na massa. A gente tem que fazer o que dá pra fazer”, finaliza.
De um modo geral, tanto pais, como alunos e também professores sentiram o impacto do coronavírus na educação e isso, sem dúvida, será determinante para as próximas gerações. As plataformas digitais devem ser uma alternativa aos modelos tradicionais, mas não uma substituição.
Com a semana do Dia Mundial da Educação, comemorado no último dia 28, toda a sociedade é convidada a pensar nos novos formatos, sem esquecer da importância que as atividades presenciais possuem na formação básica do aluno.