* Por Elber Mazaro
Dando continuidade à série de artigos sobre a transição de executivo a empreendedor baseada na minha dissertação do Mestrado Profissional em Empreendedorismo da FEA/USP, abordarei a visão que muitos executivos possuem do que é ser empreendedor.
É importante lembrar que estou pesquisando este tema com base na minha própria experiência e no meu processo de transição. Não há um tipo padrão de executivo ou de empreendedor, mas características que prevalecem em perfis profissionais semelhantes, portanto meu objetivo não é generalizar e sim compartilhar aprendizados e resultados de pesquisas acadêmicas e empíricas sobre o tema.
Inicio com a minha visão sobre empreendedorismo em 2012, na época em que decidi deixar de ser executivo e quando o tema ainda não tinha se transformado na “bola da vez” em veículos de comunicação e cursos do mercado. Após mais de 20 anos trabalhando em empresas de grande e pequeno porte, nacionais e multinacionais, formei uma visão de empreendedor, muito semelhante a que conhecemos para um empresário. O empreendedor era alguém que decidia ter independência e montar seu próprio negócio, independente da área de atuação (apesar do destaque para as startups) e que tomava riscos para si, ao trazer para o mercado produtos e serviços, inovadores ou não.
No início eu entendia que poderiam existir empreendedores dentro da empresa, que buscavam fazer de uma maneira diferente as atividades a eles alocadas. Também percebi muitas empresas investindo em inovação, buscando novos modelos de negócio, novos produtos e novos processos para serem mais competitivas e atenderem melhor seus clientes. Mas eu via isto com uma evolução natural da tarefa dos líderes, gestores e profissionais que desejavam crescer e não necessariamente algo associado ao rótulo de intraempreendedorismo.
Vamos lembrar do que defini como executivo para a minha pesquisa: são profissionais com função de liderança, que se reportam para o principal gestor da empresa no país, ou seja, normalmente diretores que respondem para um presidente ou diretor geral, em empresas de médio ou grande porte, ou o próprio executivo número 1.
Um executivo bem sucedido vê muitas vezes o empreendedor como aquela pessoa que não conseguiu desenvolver sua carreira em empresas como gostaria e buscou um caminho alternativo. Reconhece que muitas vezes a razão de empreender é por necessidade (falta de opção na carreira corporativa) ou por falta de adaptação ao modelo empresarial tradicional.
Muitos profissionais em cargo de direção só vão pensar no empreendedorismo no momento em que se aproxima a aposentadoria, ou quando há uma crise e precisam avaliar alternativas de futuro e, como eu, normalmente confundem empresário com empreendedor.
Também são reconhecidos como empreendedores, pelos executivos, aqueles que descobrem uma oportunidade de negócio em um determinado segmento e decidem investir seu recursos, principalmente tempo, para atender a uma necessidade mapeada.
No meu primeiro semestre do mestrado, fiz com duas colegas uma pesquisa para a Disciplina de Comportamento Humano, com profissionais que já haviam trabalhado com carteira assinada e depois decidiram montar seu próprio negócio. Reconheço que a metodologia aplicada à pesquisa não foi a ideal, pois misturamos um formato de pesquisa quantitativa, com uma amostra por conveniência, com uma quantidade pequena de respondentes, aproximadamente trinta e cinco, e com alguma superficialidade e até mesmo equívocos na associação das teorias de motivação e necessidades com o desenvolvimento do questionário, que foi enviado por email.
Eu aproveitei para fazer um filtro nas respostas, para identificar os que possuíam cargo executivo. De qualquer maneira, a conclusão a que chegamos batia com as conversas que eu tinha com colegas do mercado e com outras fontes empíricas. A maioria dos respondentes e dos ex-executivos entendia que eram empreendedores ao tomarem riscos e atuarem de maneira independente, com um negócio próprio, mesmo que fossem profissionais autônomos, como consultores ou professores ou que não estivessem ligados a qualquer inovação, por exemplo abrindo um franquia; ou seja, uma visão diferente do que muitos teóricos e especialistas em empreendedorismo defendem.
Lembremos que o executivo muitas vezes está em sua torre de marfim, com seu tempo tomado entre as disputas de poder e a pressão por resultados, enquanto continua buscando conforto e segurança para sua família, nos benefícios da posição. E neste cenário, não é fácil olhar para fora e ver outras opções de vida e modelos profissionais, que no primeiro momento lhe parecem mais trabalhosos e menos recompensadores. Pelo menos até o dia em que sejam forçados.
Creio que esta visão também está mudando, pois o tema do empreendedorismo está cada vez mais exposto (até demais), e o modelo tradicional corporativo / executivo está saturando, o que resulta em mais possibilidades de acesso a informação e mais interesse por parte dos executivos, em aprender e até considerar o empreendedorismo como uma opção.
Espero que o resultado da dissertação e esta série de artigos ajude com dados e processos nesta direção. No próximo artigo vamos ver a diferença entre os perfis do empreendedor e do executivo.
Elber Mazaro é cofundador do Descomplicando Carreiras. Assessor, consultor e professor em Estratégia, Marketing e Carreiras. Mestrando em Empreendedorismo na USP, com pós-graduação em Marketing e bacharelado em Ciências da Computação. Possui mais de 25 anos de atuação mercado de tecnologia e liderança de negócio, marketing, vendas, serviços e área técnica.