* Por Filipe Ribeiro Duarte
Nos últimos anos, a expressão ESG (Environmental, Social and Governance) tem se tornado um tema frequente nos noticiários, nas pesquisas na internet e pautas de investidores e diretores das empresas. O crescimento é compreensível por diversos fatores, e dois merecem destaque. O primeiro, a finitude dos recursos naturais e respectivo impacto ambiental e social que as empresas naturalmente ocasionam versus o crescimento da demanda por serviços, produtos e da própria população. O segundo, a tendência do direcionamento dos recursos financeiros dos principais investidores para empresas que pensam ESG na condução de seus negócios.
Segundo pesquisa realizada pela PwC, até 2025, 57% dos ativos de fundos mútuo na Europa considerarão os critérios ESG na hora de investir, bem como 77% dos investidores entrevistados indicam que pretendem não adquirir produtos não ESG nos próximos anos. Não custa também lembrar que o CEO da Black Rock, uma das maiores gestoras de ativos do mundo, tem se manifestado reiteradas vezes para dizer que a gestora direcionará seus investimentos, cada vez mais, para ativos “ESG”.
Os dados e tendências do consumo, dos investidores e do próprio direcionamento do meio ambiente tornam o assunto relevante para o direcionamento dos negócios empresariais, os quais buscam perenidade, sustentabilidade e lucratividade de suas atividades e, naturalmente, transparecer isso aos clientes e investidores. É nessa transparência que surge outro grande desafio. O que, ou como, transparecer? E mais, como garantir a confiabilidade das informações aos investidores e clientes, escapando do chamado greenwashing?
A preocupação é relevante, principalmente pelas discussões em torno da divulgação mascarada de informações que tentam levar o investidor ou consumidor a erro. Vale lembrar que a CVM exigirá a partir de 2023, nos formulários de referência das companhias abertas, informações sobre aspectos socioambientais das companhias. Logo, além de se preocupar com o alinhamento estratégico do tema ESG no direcionamento do negócio, precisam prestar informações confiáveis ao mercado, principalmente em seus relatórios de sustentabilidade.
E o tópico tem mais um elemento complexo. Ainda que as principais consultorias globais se reúnam e tentem criar parâmetros comuns e harmônicos de análise e divulgação dos dados dos fatores-chave do ESG entre as empresas, atualmente inexiste meios únicos capazes de avaliar o desempenho das organizações nos pilares de forma padronizada. Cada consultoria ou metodologia, naturalmente, classifica e atribui uma nota diferente às empresas. Foi o que demostrou a Bloomberg em parceria com a XP Investimentos, ao comparar as notas da Tesla em três diferentes metodologias que se propõem a mensurar a adoção de fatores ESG pelas empresas:
Como resultado dessa falta de parametrização da análise e leitura dos dados, as empresas acabam prestando contas aos investidores de forma diferente, o que dificulta a análise e comparação entre elas ou de qual investimento realizar.
E qual o elo do tema com a tecnologia e, principalmente, a blockchain? Ora, de algum modo ambos os temas estão relacionados à capacidade de inovação das empresas. Por outro lado, blockchain é um dos meios tecnológicos atuais mais seguros para registrar e confirmar transações dos usuários, em razão do seu modo de funcionamento e inviabilidade de mutação ou fraude. Inclusive, essa é a aposta de Lewis Tian, ao creditar à tecnologia blockchain e aos smart contracts um caminho mais seguro para a confiabilidade das fontes e informações relacionadas ao tema ESG.
Com o intuito de criar um gerenciamento seguro, eficaz e transparente da cadeia de suprimentos, o blockchain desponta como ferramenta eficaz para rastrear o movimento em tempo real de bens e serviços. A tecnologia tem sido adotada por diversas aplicações, que passam por ofertantes de serviços financeiros, (por exemplo, Ripple e Libra), distribuição de alimentos e agrícolas (por exemplo, IBM Food Trust e Bumble Bee Foods), cadeias de suprimentos de saúde e farmacêutica (como ProCredEx e MediLedger). Outro exemplo é a Green Mining que utiliza blockchain para rastrear os lotes de resíduos, para garantir o peso e o tipo de material em cada local de coleta. A pesagem é feita localmente e fotografada para armazenar registros, e, por fim, o material recebe um código rastreável através de blockchain, ou seja, sem possibilidade de adulteração. Ainda, destaca-se a Arabesque, que usa seus próprios conjuntos de pontuações ESG e inteligência artificial para gerenciar investimentos com base no desempenho financeiro e ESG.
A temática ESG não é simples e de difícil mensuração e inserção nas mesas decisórias das empresas. Porém, parte da dificuldade em se medir os parâmetros e números que influenciam na adoção das práticas ESG pode ser resolvida por meio da tecnologia, em especial, o blockchain, em razão de seu potencial para garantir informações fiéis e auditáveis que reflitam o desenvolvimento sustentável das empresas.
(*) Filipe Ribeiro Duarte é Mestre em Direito Empresarial pela UERJ e advogado especializado em direito digital do Martinelli Advogados em Joinville (SC)