Aportes, pitches e contatos com os maiores players do investimento são comuns no dia a dia de um empreendedor, mas muitas startups iniciantes ainda têm dúvidas sobre o processo de captação.
Para ajudá-las, demos início a uma série de matérias com dicas práticas de importantes investidores e empreendedores do mercado. Eles falam sobre quais investimentos buscar no início da companhia, o que fazer para atrair investidores e como preparar um pitch matador.
Em março, em homenagem ao Dia Internacional das Mulheres, convidamos diversos nomes femininos renomados do ecossistema. Para fechar esse mês com chave de ouro, o Startupi entrevistou Ana Fontes, fundadora da Rede Mulher Empreendedora, que tem o propósito empoderar empreendedoras, garantindo independência financeira e controle de seus negócios e suas vidas.
Por onde começar?
Ana começa dizendo que é muito comum as pessoas quererem atropelar os passos para chegarem na captação, mas é importante subir degrau por degrau para alcançar o objetivo. Entenda o momento do negócio. “É uma ideia que está num PowerPoint? É uma ideia que já foi botada em prática? Está no MVP? É um projeto que ainda não foi executado? É muito mais difícil conseguir recursos se sua solução não chegou ao mercado.”, explica.
O MVP, Minimum Viable Product ou Produto Mínimo Viável, é quando a startup construiu uma versão mais simples e enxuta da sua solução ou produto, empregando o mínimo possível de recursos para entregar a principal proposta de valor da ideia. Assim é possível validar o produto antes de seu lançamento. A fase final do MVP é tensa e exige vários testes para entender a adesão do seu produto ao seu cliente.
“É fundamental entender qual o momento do seu negócio e se ele realmente está precisando captar investimento, ou se precisa de mais tempo para testar o seu MVP”.
Saiba como buscar o recurso financeiro. “Você não precisa virar um especialista, mas você tem que saber quem é o investidor, como é que funciona o processo de investimento, que tipo de investidor está buscando o seu tipo de negócio e qual é o seu diferencial”. Não adianta buscar um cheque alto com investidores-anjo, por exemplo. Se quiser um aporte maior, busque por fundos de investimento.
Aprenda a linguagem do mercado. Muitas pessoas começam a empreender sem saber o que é um pitch deck (apresentação que deve mostrar um resumo da sua startup para os investidores), o que é uma captação, o que são investidores-anjo e isso não é um problema, uma vez que você é novo no ecossistema. É importante perguntar quando tem dúvida ou quando não sabe uma nomenclatura, assim você aprende e vai construindo seu repertório.
O investimento-anjo é feito por pessoas físicas, com capital próprio em novas startups com alto potencial de crescimento. Esse é apenas um degrau de uma escala de investimentos que o empreendedor terá que passar para realmente crescer a atingir o patamar de sucesso que almeja. Para buscar a captação ideal, é preciso entender cada uma das etapas e as principais características desses tipos de financiamento e ver qual delas se relaciona com o estágio do seu negócio.
Trajetória
Ana Fontes iniciou cedo sua trajetória no mercado de trabalho. Aos 11 anos fazia bicos para as vizinhas e sua mãe, que costurava. Com 14 anos estava com carteira de trabalho registrada. Trabalhou em bazares, fábricas e em áreas administrativas, mas grande parte da sua carreira foi na indústria automotiva, onde ficou por 18 anos, atuando em marketing.
Em 2007, resolveu empreender e abriu seu próprio negócio, uma plataforma na internet de recomendação de bons serviços. Ana diz que cometeu todos os tipos de erros e entendeu que estava na hora de aprofundar seus conhecimentos no universo digital e dos negócios.
Três anos depois, foi selecionada para participar do Programa 10 mil Mulheres da Fundação Getúlio Vargas, onde aprendeu mais sobre empreendedorismo. Para compartilhar seus sentimentos, Ana criou um blog, onde escrevia sobre os medos, as dúvidas e as incertezas do empreendedorismo feminino no Brasil. Ao notar que muitas mulheres respondiam seus textos mostrando os mesmos questionamentos e dificuldades, deu gás para o seu projeto e, em 2014, o blog virou a Rede Mulher Empreendedora (RME), uma das maiores plataformas de apoio ao empreendedorismo feminino no País, que já impactou mais de 750 mil pessoas.
O objetivo da RME é fomentar o protagonismo feminino no empreendedorismo, auxiliar quem quer empreender e quem quer se inserir no mercado de trabalho, através de diversas iniciativas e eventos anuais como a Casa das Empreendedoras e o Fórum Empreendedoras, eventos mensais como Café com Empreendedoras e Mentorias. Também conta com um programa de aceleração, o RME Acelera, cursos intensivos, trilhas de conhecimento on-line e o programa RME Conecta, que faz a ponte entre negócios de mulheres com grandes empresas para negociação e fornecimento B2B.
Em 2017, Ana resolveu ampliar seus objetivos e trazer um braço social para o projeto, e criou o Instituto Rede Mulher Empreendedora. Com a ajuda de parceiros, a iniciativa faz uma série de ações para mulheres em situação de vulnerabilidade social, trazendo sua independência financeira e capacitação para ter o controle de suas próprias vidas.
A empreendedora comenta que o momento mais marcante da sua carreira foi quando criou coragem para sair do mundo corporativo. “Eu tinha uma carreira corporativa com muita discriminação, preconceito e tudo que você pode imaginar, mas de certa forma, eu tinha segurança, tinha um salário que pagava minhas contas. Mas quando você se joga no ambiente empreendedor é tudo incerto”, explica.
“Tive medo de dar errado e passei por momentos difíceis, os 5 primeiros anos foram assustadores, falta de dinheiro, dificuldade do negócio, de não ter as teses de investimento aprovadas, de não entender direito qual era o meu modelo de negócio. Foi bem difícil. Estou há 14 anos nessa jornada, mas foi bem difícil”, completa.
Pitch matador
Ana explica que é importante mostrar em seu pitch o problema que seu negócio irá resolver. Ainda, se a solução vier atrelada a uma história da vida do empreendedor, como por exemplo, ‘estou trazendo essa solução ao mercado porque tive obstáculos nessa área’, é algo que chama a atenção da investidora.
Também é importante mostrar o tamanho do mercado onde ele está inserido também, de forma estruturada e segmentada. Levantar seus concorrentes, mesmo que indiretos, e explicar exatamente quem é o público que irá usar a sua solução.
Outro ponto é mostrar o quanto de resultado a sua startup já tem. Investidores aplicam dinheiro em soluções que já estão demonstrando um certo resultado. “Mostre o dia que você começou e em que nível da curva de crescimento você está hoje. Eu quero investir em quem tem a curva mais ascendente possível e também comente sobre a quantidade de clientes até o momento”.
Falar sobre o time também é fundamental. Ana diz que sente angústia quando vê um time muito homogêneo, onde os sócios e fundadores têm o mesmo perfil e não são complementares. Explique quem faz essa solução andar e crescer dentro do mercado. E fale o valor do investimento que você está buscando e porque está procurando por captação, vai investir em crescimento, em marketing, em pessoas, em comunicação, no que?
E por último, Ana diz que é importante o empreendedor mostrar a emoção, o brilho no olhar, a vontade que tem de fazer o negócio dar certo. “Já tive casos que avaliei mal em bancas porque o empreendedor fazia o discurso no mesmo tom, não demonstrava nenhuma vontade de fazer as coisas acontecerem. Isso não é sobre timidez, é sobre não mostrar vontade”, relata.
O que um investidor busca
A investidora busca principalmente, negócios liderados por mulheres, por conta da origem do seu trabalho e que tenha diversidade. A segunda questão que ela valoriza são negócios que tenham uma ligação forte com o impacto social. “Não precisa ser uma ONG, mas tem que ter um olhar para a questão social. Pode sim ser um negócio de beleza, mas que por exemplo, empregue mulheres de áreas mais vulneráveis”, explica.
Ana também busca a sinergia com o empreendedor e conta sobre um caso de investimento que não deu certo. O negócio era super conhecido, estava no hype do ecossistema, mas há cerca de quatro anos fechou a operação porque a empreendedora se desentendeu com os investidores. “Foi um negócio bem difícil, mas teve muito aprendizado para ela e para mim. Entendi a importância de escolher corretamente os investidores e saber porque você está buscando dinheiro”.
Nesse ponto entra a necessidade de verificar em que momento o seu negócio está. Se ele realmente precisa de um aporte ou se precisa ser repensado, porque a startup não está conseguindo a escala necessária para se manter. “Eu falei para a empreendedora que seria importante rever a sede do negócio, entender se ele de fato está resolvendo o problema e o quanto ele precisa de uma escala, porque a curva de crescimento dela nos últimos seis meses era bem ruim. Não busque dinheiro pelo dinheiro”.
Ana finaliza dizendo que é fundamental o empreendedor entender porque está buscando o dinheiro, onde ele vai aplicar esse cheque, quais soluções irá criar e o que irá oferecer para o mercado, ou caso contrário, ficará muito vazio para ele buscar uma captação.
Para conferir a última matéria desta série do Startupi, clique aqui! A última entrevistada foi a Marcella Ceva, CIO do WE Ventures.
* Foto destaque: Ana Fontes, fundadora da Rede Mulher Empreendedora.
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