No último dia 4 de maio, o Banco Central do Brasil (BC) apresentou um conjunto de regras e as quatro fases de implementação do chamado Sistema Financeiro Aberto, ou Open Banking, no país. O anúncio foi autorizado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão superior do Sistema Financeiro Nacional, que tem a responsabilidade de formular a política da moeda e do crédito, com o objetivo de estabilidade da moeda e o desenvolvimento econômico e social do Brasil.
Com previsão para começar a funcionar apenas no dia 30 de novembro deste ano e implementação completa até outubro de 2021, o Open Banking consiste em abrir a instituição financeira para que outras empresas tenham acesso aos dados do cliente, mediante consentimento deste. O objetivo do BC é incrementar a concorrência entre bancos e, com isso, a redução da taxa de juros.
“Um exemplo antigo desse conceito é o download de extrato, que já permite ao dono da conta baixar seu extrato em meio eletrônico e enviar para um contador, por exemplo. Mas, no Open Banking, o usuário poderá autorizar que o software de contabilidade do contador tenha acesso direto ao extrato de sua conta corrente, através da Interfaces de Programação de Aplicativos (APIs), evitando esse trabalho todo”, destaca Carlos Netto, CEO da Matera, empresa de tecnologia para os mercados financeiro, varejista e de gestão de riscos.
Fases de implementação do Open Banking no Brasil
O Open Banking vai ser implantado por fases até o ano que vem. Serão 4 etapas ao todo e elas funcionam como uma espécie de “escada”, que eleva aos poucos as instituições ao atingimento da maturidade do novo sistema.
“A primeira delas diz respeito à abertura de dados dos produtos e serviços da instituição de modo que aplicações terceiras possam consultar abertamente. Isso deve ocorrer até 30 de novembro de 2020. A segunda fase prevê compartilhamento dos dados financeiros e transacionais dos clientes mediante seu consentimento. Tal fase deve ser finalizada até maio de 2021. A terceira fase interliga funcionalidades do PIX (sistema de transferências e pagamentos) e habilita a iniciação de pagamentos a partir de apps de terceiros, também mediante consentimento do cliente. Deve ocorrer até agosto de 2021. Por fim, a quarta fase expande a cobertura de serviços incluindo câmbio, seguros e investimentos e deve ser finalizada até outubro de 2021”, explica Fabiano Amaro, Consultor de Negócios da Matera.
Regras
Uma das regras do Open Banking é a implantação do DPO (Data Protection Officer), a figura mais importante dentro das empresas no que diz respeito ao compliance em relação aos dados que ela mantém de seus clientes. É do DPO a tarefa de criar e apresentar relatórios semestrais sobre a troca de informações e serviços da instituição para a qual ele trabalha. “Será ele que irá orientar e aconselhar os demais departamentos da empresa sobre a forma adequada de gestão de dados conforme regulação da Lei Geral de Proteção dos Dados (LGPD)”, explica Fabiano.
A nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD, nº 13.709/18), inclusive, foi recentemente prorrogada para entrar em vigor em maio de 2021. Assim como previsto no código, caberá às instituições financeiras proteger, gerenciar e tratar vazamentos de dados dos clientes. O banco também deverá manter à disposição do BC pelo prazo de cinco anos os dados compartilhados entre instituições, incluindo os términos de contrato e a execução de testes, além de definir, em convenção, os padrões técnicos das interfaces de troca de dados (API).
“Se pensarmos bem, a LGPD quase que obriga a existência de um Open Banking. A segurança é um requisito fundamental para que o usuário nunca autorize outros a acessar sua conta acidentalmente. Hoje já existe o consentimento para conectar na sua conta de e-mail, por exemplo. Sabemos que usuários mais leigos acabam autorizando hackers a terem acesso ao seu e-mail simplesmente por não entenderem o que estão fazendo. A consulta pública está ai justamente para a sociedade cooperar com o BC e com isso produzir algo seguro e confiável”, afirma Carlos.
Benefícios do Open Banking
A burocracia relacionada aos serviços bancários tradicionais estão entre as principais insatisfações dos clientes brasileiros. Com a nova função, o contratante do serviço vai conseguir usar, com mais facilidade, serviços de outro banco. “Ninguém é obrigado a continuar consumindo serviços de um fornecedor do qual não goste. Com o Open Banking, somado ao PIX (que criou a portabilidade do número da conta), o usuário vai poder trocar de banco livremente, o que tende a melhorar este ponto”, afirma Carlos.
Além disso, para os bancos, o CEO afirma que a nova modalidade vai significar uma redução de custo operacional, já que os softwares de gestão empresarial das empresas vão conversar diretamente com os softwares dos bancos. “Outro ponto é que se o Open Banking não sair logo, os softwares de gestão empresarial, que de fato comandam as cobranças e pagamentos das empresas, podem ter a ideia de virar bancos. Neste sentido, o Open Banking pode ser grande amigo dos bancos. Mas a tendência é que haja mais concorrência e isso é melhor para os clientes, nem tanto para os bancos”.
Já em relação aos bancos digitais, Netto destaca que eles possuem a vantagem competitiva de não terem agências. “Fora isso, eles terão que ter APIs padronizadas; muitos investiram bastante criando suas APIs e possivelmente terão que alterar tudo para ficar de acordo com o padrão”.
Carlos ainda acrescenta a importância de iniciar o acesso a esse sistema, sobretudo após a pandemia causada pelo novo coronavírus. “O desejo em aumentar a competitividade no Brasil é antigo, mas, com a pandemia, qualquer ajuda que reduza custo da sociedade é bem-vinda”. Fabiano concorda com Netto e destaca que a recuperação da economia também diz respeito ao nível de liquidez e oferta de crédito que haverá no mercado para apoiar o consumidor e as empresas. “Com o Open Banking em vigor, haverá menor concentração bancária e disputa pela oferta de serviços e produtos financeiros, algo que pode tornar mais eficiente o sistema como um todo”.
Open Banking e o futuro
A implementação de um novo sistema financeiro também pode ser o início de uma série de avanços que os bancos precisam adotar para acelerarem sua transformação digital. “Quanto mais as empresas estiverem conversando com os bancos através dos seus respectivos softwares, mais digitais os bancos vão ser”, destaca Carlos.
O CEO acredita que Banco Central pode adotar medidas semelhantes no futuro. “Se olharmos o que o Banco Central vem fazendo nos últimos 20 anos (pelo menos), vamos ver que foram muitas ações em favor da sociedade. Tivemos o SPB, os arranjos de pagamento, o pagamento instantâneo (PIX) e agora o Open Banking; sem contar vários outros menos “marcantes”. Tudo indica que o BC vai continuar buscando aprimorar o sistema financeiro para atender melhor a sociedade, mantendo a solidez das instituições, dado que esta solidez nos interessa”, finaliza.