* Por Lucas Mantovani
A gente sabe que uma startup precisa ter um bom produto, um time competente e o market fit para ter uma chance de competir no mercado de inovação.
Cada área da empresa precisa funcionar de forma colaborativa, aglutinando know how, experimentação e resiliência para enfrentar os fracassos e aprendizados de cada dia.
Mas o pano de fundo para que cada uma dessas engrenagens funcione é um emaranhado de contratos, todos bem arranjados e alinhados ao modelo de negócios.
Ao menos, esse é o cenário ideal.
A estrutura jurídica de uma empresa é fundamental para que ela possa crescer e até escalar de forma sustentável, especialmente num mercado tão receptivo aos riscos.
A proposta deste artigo que inaugura minha participação aqui no Portal Startupi é apresentar a você, leitor, um survival kit jurídico para a sua startup.
É o Bê a Bá para qualquer um que queira empreender com startups. Vamos lá?
Relação entre sócios: comece colocando o “combinado” no papel
O primeiro documento que precisa estar no “survival kit” é o contrato que vai regulamentar a relação entre os sócios ou fundadores da empresa.
O tipo de documento vai variar, conforme o estágio do negócio.
Se for antes da constituição da pessoa jurídica, quando vocês ainda estão trabalhando na hipótese que vai ser validada, você vai precisar de um Memorando de Entendimentos.
O Memorando deve prever qual será o objeto da operação, regras de administração, hipóteses de entrada ou saída de novos founders ou investidores.
Também é importante definir se haverá exclusividade de algum fundador, participação societária futura, além das regras de confidencialidade e não-concorrência.
Se for depois da constituição da pessoa jurídica – que geralmente começa como uma Sociedade Limitada -, você vai precisar de um Acordo de Sócios.
O Acordo de Sócios serve para definir as regras que vão proporcionar estabilidade aos ajustes entre os sócios, evitando embaraços prejudiciais à empresa.
Este acordo pode prever as práticas de governança, regras de administração, como serão feitas as deliberações entre os sócios e até a prestação de contas da sociedade.
Relação com clientes: a regra de ouro é a transparência
A Política de Privacidade é um documento obrigatório do nosso survival kit.
Por muito tempo, a privacidade era apenas uma pauta na mídia ou blogs que alertavam sobre as big techs e a utilização irracional de dados pessoais dos seus usuários.
Nos últimos anos, as leis de privacidade ganharam mais destaque e entrou em vigor no Brasil a Lei Geral de Proteção de Dados – a famosa LGPD.
A Política de Privacidade é o contrato (sim, é um contrato) que vai tornar transparente ao titular dos dados o modo como sua empresa vai fazer uso de suas informações.
Mesmo que a startup ainda esteja em validação, se há coleta de dados que identificam uma pessoa ou tornam ela identificável, você vai precisar de uma política dessa natureza.
Outro documento que precisa estar no seu “survival kit” é os Termos de Uso, especialmente se sua startup tem uma base tecnológica como plataforma ou site.
É nele que você vai incluir os disclaimers de responsabilidade, deixando claro para o seu cliente o que pode ou não pode acontecer durante sua relação com ele.
O momento certo para fazer esse documento é quando sua empresa começa a ter seus primeiros clientes – pagantes ou não.
A marca é parte do conjunto de ativos da sua empresa
No Brasil, uma marca só é sua se ela estiver registrada no seu nome – ou no nome da sua empresa, se já houver uma pessoa jurídica.
Se você já começou o seu negócio com uma identidade visual definida, o registro da sua marca (nominativa, figurativa e mista) é fundamental antes de “dar as caras” no mundão.
Você não precisa de advogados para isso. Basta dar uma olhadinha no manual de marcas do INPI, disponível no site, e ter uma grana para pagar as taxas de registro.
Mais um item para colocar no nosso survival kit.
Comece, nem que seja só pelo MVP jurídico
Startups não precisam de uma estrutura jurídica robusta no começo – e nem tem capital para isso, geralmente.
Encare esse survival kit como um MVP jurídico da sua startup.
Não custa lembrar o alerta do Eric Ries em “A Startup Enxuta”:
Muitos [empreendedores] adotam uma atitude “simplesmente faça”, evitando todas as formas de gestão, processo e disciplina. Infelizmente, essa abordagem conduz com mais frequência ao caos do que ao sucesso. (p. 13)
Você pode até tentar adiar, mas nunca vai se livrar da gestão jurídica da sua empresa.
Lucas Mantovani é especialista em Direito da Tecnologia, sócio fundador do Cunha Mantovani Advogados e cofundador da Legaltech Marquei. É advogado e mentor ativo do programa Inovativa de Impacto.