* Por Mauricio Medeiro
Há muitos anos que vivo o contexto de inovação sob a ótica do design e não há um só dia que eu não seja provocado e instigado à ideia de pensar e projetar futuros. Sou entusiasta e especialista em Future Thinking, o que sempre me trouxe inúmeros questionamentos e, principalmente uma vontade genuína de me conectar com mais pessoas para gerar e desenvolver projetos que realmente transformem a vida como a conhecemos. Não à toa o movimento que vemos no mundo corporativo reflete a necessidade de adaptação de toda sociedade aos novos tempos e ao que vimos enfrentando nesse momento que chamo de era inter-covid.
O mundo em que estávamos foi levado pela pandemia e será preciso entender as demandas do mercado e os novos padrões de comportamento dos consumidores, novos hábitos das pessoas para os próximos meses. Mas como repensar os negócios levando-se em conta que ainda iremos conviver com o coronavírus entre nós por vários meses? É nesse contexto que o design vem conquistando o status de ferramenta estratégica para um número cada vez maior de empresas no último ano e meio.
A pergunta na cabeça das lideranças das empresas é: O que é o design de serviços e como pode destravar a inovação para os negócios? Como essa modalidade influencia o mercado e pode construir futuros alinhados às estratégias empresariais?
Nos últimos anos, diversas iniciativas para medir o impacto do design surgiram no mercado. Em 2014, pesquisadores de Harvard criaram um índice composto por empresas centradas no design e o compararam com o S&P. O resultado estimado é de que um investimento no Design Index, como o batizaram, seria mais de 200% superior ao do tradicional índice do mercado acionário americano. Já a consultoria McKinsey, em 2018, lançou o seu próprio índice de design e constatou que as empresas centradas na disciplina apresentaram receitas 32% maiores e retorno aos acionistas até 56% superiores na comparação com as outras.
Se isso foi medido no cenário pré-pandemia da Covid-19, agora que vivemos essa realidade de transformação digital tão acelerada, impactando diretamente a maneira como vivemos e trabalhamos em tão pouco tempo, o design tende a ficar mais perceptível como ferramenta estratégica. Listo a seguir sete aspectos que devemos considerar, pois evidenciam o potencial de inovação que o design proporciona.
1) Alguns segmentos podem se beneficiar antecipando as adaptações necessárias para esses comportamentos de consumo, a pós-covid-economia-do-cuidado. O que comprova que o Design Centrado no ser humano está mais importante do que nunca.
2) A harmonia entre o digital e o presencial também precisa atingir os consumidores. De acordo com a designer de serviços e professora do Istituto Europeo di Design (IED), Cassia Desbeseli, a experiência de todos deve ser fluida em todos os espaços. O que vai acontecer mesmo é a união entre o offline e o online, a criação do omnichannel.
3) Os negócios devem esperar comportamentos polarizados após a passagem do COVID-19. Já observamos um comportamento hedonista, exploratório e extrovertido dos jovens em contraponto a um comportamento mais minimalista e focado em um comportamento cívico – a responsabilidade social.
4) A questão da fidelidade deixou de passar pela marca e foi para a experiência. No entanto, a essência do design de serviço não são as imprevisibilidades e as crises no mercado, e sim a experiência de quem consome. Segundo pesquisa da consultoria de negócios PwC Brasil, 73% das pessoas entrevistadas no mundo têm a experiência do cliente como fator de compra.
5) O trabalho remoto acabou com a espontaneidade, tão necessária para processos criativos e de inovação. A ausência das expressões faciais e sons como grunhidos e risadas afetou a interação entre quem falava e quem ouvia. Uma possível saída para essa situação seria equilibrar o digital com o presencial na vida das pessoas e ampliar as experiências no metaverso.
6) O futuro do design de serviço está muito ligado a uma indexação com o User Experience, é o que pontua a co-fundadora da Archipelago, Clarissa Biolchini. Com a intenção de evitar as experiências ruins, ela explica que quando o serviço é desenhado, o designer se baseia nas oportunidades de torná-lo o melhor possível, para trazer a jornada ideal para aquela pessoa, evitando assim o abandono da empresa.
7) O estudo “Future of Jobs”, publicado pelo Fórum Econômico Mundial (FEM) em 2018, mostra que 59% dos empregadores entrevistados para o relatório esperam que eles terão modificado de maneira significativa o jeito de produzir e distribuir, mudando a composição da cadeia de valor. A pesquisa ainda prevê que até 2022 crescerá a procura por profissionais que possuem habilidades mais “humanas”. Algumas das qualificações que serão as mais almejadas serão os especialistas em desenvolvimento organizacional, gerentes de inovação, designers de User Experience (UX), especialistas em interação entre máquinas e humanos, engenheiros robóticos e especialistas em blockchain.
Design como ferramenta estratégica
Para complementar essa visão do design como ferramenta estratégica para empresas e empreendedores, indico a leitura do Report Especial Negócios 2023 – A influência do design e inovação para a construção de futuros, material colaborativo no qual trabalhei recentemente. Junto com especialistas do mercado de inovação e design, exploramos reflexões sobre as tendências e novos modelos de serviços, produtos e negócios que façam sentido no mundo inter-Covid. Chamo atenção para três tempos importantes que definiram inclusive o projeto visual do relatório: o tempo de adaptação, o tempo de aprender e o tempo de planejar. Sugiro essa premissa quando enfrentarem um desafio de transformação. Estão ali reunidos cases de empresas que apostaram no design e colhem resultados positivos até hoje, além da reflexão dos co-autores sobre a sociedade desde os desafios da casa-escritório-escola, passando pela revisão dos serviços e ofertas do mercado até a construção de cenários futuros sustentáveis e mais humanos.
Mauricio Medeiros é arquiteto, designer industrial e mestre em Ambientes Narrativos pela Central Saint Martins, em Londres. Possui uma carreira dedicada ao design estratégico com um olhar em Future Thinking e se utiliza da narrativa como ferramenta que potencializa o storytelling/storymaking entre marcas e seu público através de produtos, serviços e experiências. Professor no Istituto Europeo di Design (IED), desde 2020 também atua como Head de Design na Kyvo. Durante seus 30 anos de carreira, foi responsável por inúmeros cases nacionais e internacionais em diversos setores.