Hoje Bob Wollheim subiu ao palco Gutenberg da Campus Party para colocar os pés no chão e mostrar o outro lado do empreendedorismo, quebrando alguns dos principais mitos que tangem esse mundo.
O tom não era de pessimismo, mas de realismo — com provocações para ajudar algumas pessoas abaixarem a bola. Não por acaso, a palestra começou com o conhecido vídeo ‘Entrepreneur State of Mind’ , uma paródia um tanto ácida de ‘Empire State of Mind’ (Jay-Z ft. Alicia Keys), mostrando o que há por tras do hype do Vale do Silício.
Logo na sequência, Wollheim começou a apresentar mito a mito (logo abaixo) e desmontá-los com alguns argumentos interessantes:
1) Empreendedorismo é um tesão
Nem sempre. É muito trabalho, é um ritmo muito louco, que muitas vezes acaba com sua vida pessoal. Vende-se a sensação de que você vai ter festa todo dia, vai dominar o mundo, etc. Isso pode acontecer e também faz parte, mas não é só isso.
“Eu gosto muito dessa energia toda, deste mundo empreendedor, mas você tem que olhar para o próprio umbigo e saber o preço que se paga para empreender. E esse preço é mudar sua vida radicalmente”, diz Wollheim.
2 Empreender é só felicidade
Empreender pode ser feliz, mas também nem sempre. Vale lembrar que, no Brasil, apenas 75% das empresas passam do segundo ano. “Se eu falasse para minha mulher que vamos viajar neste final de semana, mas que há poucas chances de ter um acidente e não conseguirmos chegar, provavelmente a gente não iria”, comenta.
Há muitos momentos de infelicidade e não há quem culpar, além de você mesmo. “Se você não tem clientes, não está conseguindo vender, o imbecil é você — afinal de contas, você é o chefe”, diz. “É claro que ainda há momentos de extrema felicidade quando você vê o logotipo de sua empresa em algum lugar, etc… é um tesão indescritível”, alivia.
3 Um ppt na mão vale 1 milhão
Normalmente quando você lê uma história de sucesso na imprensa, ela foi encurtada. São muito raros os casos de gente que deu certo do dia para a noite. “Normalmente, o cara está há muito tempo na estrada, deu muita cabeçada e já fez muito mais que um ppt”, lembra. “Empreender e ser bem sucedido é uma exceção. E empreender é sempre trabalhar com a exceção”, ressalta.
4 É preciso ganhar prêmios
Não necessariamente as empresas premiadas irão dar certo. “O prêmio é só uma etapa, o reconhecimento de um bom momento. Nada mais que isso”, lembra Wolheim ao dizer que há apresentações incríveis que são feitas exclusivamente para ganhar um prêmio, mas que não são condizentes com o que a empresa de fato é.
5 Mentoria é importante.
“Mentoria realmente é super legal, mas o que eu tenho visto? Tenho visto que, muita gente ao pedir mentorias, começa a acreditar em tudo o que está sendo dito e quer mudar o negócio ali na hora”, comenta Wollheim, que dá diversas mentorias e muitas vezes é solicitado a dar conselhos em áreas que ele nem conhece.
“Tem gente que vem me pedir mentoria, por exemplo, em biotecnologia. Eu nem sei como são as coisas neste mercado, não adianta perguntar para mim. E isso é algo extremamente perigoso e que pode desviar o caminho do empreendedor”, explica.
Wollheim ainda lembrou que há um outro caso, em que as pessoas vão a uma mentoria não para ouvir conselhos, mas apenas as confirmações de que aquilo que elas fazem é bom. “As pessoas ficam irritadas quando ouvem criticas e acham que aquilo é algo pessoal”.
6 Aceleradora resolverá seu problema
Há duas coisas que bombaram no empreendedorismo brasileiro nos últimos anos: sites de compras coletivas e aceleradoras.
“Aceleradora pode ser uma bela solução para sua startup, mas depende da aceleradora. Ja vi muitos caras querendo acelerar os outros, sem nunca ter se acelerado, sem nunca ter executado algo bem sucedido”, provoca Wollheim.
É claro que há exceções de aceleradoras bem estruturadas, com pessoas experientes, dinheiro, etc. “Mas o que acontece muito é você ir a uma aceleradora, que te prepara para um DemoDay incrível, te ajuda fazer o elevator pitch para os investidores e, na maioria das vezes, eles não voltam e não investem”, diz.
“Eles te deixam com uma Ferrari em uma estrada de terra. E muitas vezes você sai pior do que entrou. Antes você estava com um jeep numa estrada de terra — ele podia ser lento, mas estava andando, pelo menos”, comenta Wollheim antes de ressaltar que a aceleradora é UM caminho, mas não O caminho.
7 Existem investidores no Brasil
“Acho que isso é um mito. Ele existem, mas são tão poucos que, estatisticamente, não existem. É aquela história: se eu tiver 1% de chance de sucesso nesse caminho, eu vou por ele? Eu diria: ‘vá também, mas não esqueça dos outros 99% de chances, que são muito maiores e estão mais disponíveis no Brasil”, explica. “Todo investidor diz que não falta capital, faltam bons projetos. É bullshit. Falta é vontade de investir, de arriscar. Vale perceber que, se você comer 1% de uma pizza de 400 metros, este 1% é bom o bastante”.
Segundo Wollheim, o que leva o empreendedorismo no Brasil é um capital criativo, que não vem necessariamente de investidores formais, como muitos conhecem.
“Há muitos caras que conseguiram empreender sem entender essa linguagem toda, sem passar por todos esses processos, e conseguiram dar certo”, diz.
8 Ter investidor é necessário
“Sou um enorme defensor da ideia de que quem tem dinheiro tem que colocar aquilo em quem tem a ideia. Só que a realidade não e tão favorável assim. Mesmo no Vale do Silício, apenas 6% das startups que querem investidor conseguem”, comenta.
O recado é: se há outros caminhos, procure por eles também. Tenha um plano B e as vezes comece já trabalhando com o plano B também.
9 Todo mundo levanta dinheiro nos EUA
Não é todo mundo nem aqui, nem lá.
10 Tech Crunch é realidade
“A realidade é a Campus Party! As mesinhas da Startup&Makers é que são a realidade. Se o objetivo da sua vida é ser igual a uma exceção, coloque o pé no chão e tenha essa consciência. O Zuckerbeg é a exceção, não a norma”, lembra.
* N.A: Todas as reflexões foram bem equilibradas e feitas não para boicotarem o mundo empreendedor ou algo do tipo, mas sim para ajudarem as pessoas colocarem os pés no chão. Afinal de contas, ter uma startup (no Brasil e no mundo) não é brincadeira, e precisa de muito trabalho.