Santa Rita do Sapucaí, localizada no Sul de Minas Gerais, acaba de receber a oitava edição do Hacktown. É uma cidade conhecida por sua história rica e sua surpreendente transformação em um polo de tecnologia e engenharia no Brasil. A história da cidade começa no século XVIII, com a chegada dos primeiros colonizadores à região, atraídos pelas riquezas naturais e pela fertilidade do solo. A cidade foi oficialmente fundada em 1839, tendo como padroeira Santa Rita de Cássia.
Durante o século XIX, a economia local era basicamente agrícola, com destaque para o cultivo de café e cereais. A cidade passou por um período de desenvolvimento com a chegada da estrada de ferro, que facilitou o escoamento da produção agrícola e o intercâmbio comercial com outras regiões.
Mas a transformação de Santa Rita do Sapucaí no polo tecnológico que conhecemos hoje começou na década de 1950, com a criação de instituições educacionais que se destacaram na formação de engenheiros e técnicos especializados. Um dos marcos dessa transformação foi a fundação da Escola Técnica de Eletrônica Francisco Moreira da Costa (ETE FMC), a primeira escola técnica de eletrônica da América Latina, em 1959. A iniciativa foi idealizada por uma visionária local, Luiza Rennó, que via o potencial de desenvolvimento tecnológico para a região.
A partir da década de 1970, a cidade começou a atrair empresas de eletrônica e tecnologia, estimuladas pela presença de mão de obra qualificada formada pela ETE FMC e por outras instituições que surgiram posteriormente, como o Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel), fundado em 1965, que se tornou um dos principais centros de ensino e pesquisa em telecomunicações do país.
O crescimento do setor de tecnologia em Santa Rita do Sapucaí levou à criação do que é hoje conhecido como “Vale da Eletrônica”, composto por uma rede de mais de 160 empresas, startups e instituições de ensino e pesquisa que atuam em diversas áreas, como eletrônica, telecomunicações, informática, automação industrial e mais recentemente, em tecnologias emergentes como a Internet das Coisas (IoT).
O ecossistema de inovação da cidade é apoiado por diversas entidades, como a Associação Industrial e Comercial de Santa Rita do Sapucaí (ACISRS) e a Fórum das Entidades de Santa Rita do Sapucaí, que promovem o desenvolvimento econômico e social, além de fomentar parcerias entre empresas, universidades e governo.
Anualmente, um dos maiores e mais relevantes eventos para o ecossistema de inovação acontece na cidade: o HackTown. O festival leva para a cidade mais de mil atividades entre palestras, shows, ativações e workshops. Nesta edição, que aconteceu de 1 a 4 de agosto, a pequena Santa Rita do Sapucaí, de cerca de 40 mil habitantes, recebeu mais de 15 mil participantes de todas as partes do Brasil e da América Latina. Na edição de 2023, o evento movimentou cerca de R$ 30 milhões na economia local.
Criação do Hacktown
João Rubens, cofundador do evento, nasceu em Santa Rita do Sapucaí, mas criado no Rio de Janeiro, João voltou para a cidade mineira aos 15 anos de idade para estudar na ETE, uma exigência de seus pais, que sabiam da qualidade do ensino local e das possibilidades que a engenharia poderia trazer. Hoje, anos depois de realizar a primeira edição do evento, João fala sobre como o Hacktown e a cidade de Santa Rita do Sapucaí são conectados.
“Na nossa primeira edição, em 2015, queríamos fazer algo que mostrasse o ecossistema fervilhante de Santa Rita para o Brasil. Planejamos um evento que acontecesse em 3 espaços, para 55 pessoas. O evento foi um sucesso, tivemos 600 participantes e uma programação que aconteceu em 15 lugares. Ali a gente viu o tamanho do potencial do Hacktown e como ele era relevante para a cidade. No mesmo ano, fizemos a segunda edição do evento, já com mais de 1.200 participantes”, conta.
Agora, quase uma década e oito edições depois, o evento reúne milhares de participantes para debater temas que vão desde inteligência artificial a espiritualidade, passando por computação quântica e o futuro da educação, tal qual sua versão norte-americana, o South By Southwest. A grande diferença entre os dois é, claramente, o tempero mineiro.
“O modelo do evento desse ano já é para poder mostrar uma bandeira que muitas vezes o brasileiro esquece, que é a nossa latinidade mesmo. Aí a gente acaba se excluindo disso, às vezes se posicionando como europeus ou americanos, que não somos. E muitas vezes, quando a gente olha essas discussões que estão acontecendo em outros eventos, que não são brasileiros, mas estão no Brasil, a gente fala que é importante nós termos os debates, importar os debates que estão ao longo da Europa, nos Estados Unidos ou qualquer outro lugar, sim, mas não é o que transforma. Então o Hacktown se propõe a abrir essas discussões sob o contexto brasileiro das coisas”, garante.
Outro grande ponto do Hacktown, que o diferencia dos grandes eventos e festivais, é a busca da organização em colocar pessoas diferentes nos palcos, para abordarem assuntos que não costumam ser abordados dentro do ecossistema de tecnologia. “Nós queremos menos monólogos e mais diálogos. Na nossa programação, tem palestras e paineis que até podem se contradizer entre si, mas é isso que a gente quer: que os participantes ouçam, aprendam e construam suas próprias verdades”, garante.
Para João, a essência do conceito de inovação está no inesperado. “A nossa visão de inovação é uma visão transversal. O que percebemos é que se levarmos a inovação ao pé da letra, o que a maioria das empresas acredita é estar falando de lucros a curto prazo. Toda empresa, todo projeto, tudo que existe que nós realizamos, gastamos energia para fazer. Não só as pessoas da empresa, mas toda uma cadeia. E é necessário que nesse contexto, quando a gente discute inovação, a gente trazer pra dentro disso uma discussão que consiga fazer com que esses players tenham todo o contexto que envolve a cadeia de inovação de uma empresa. Eu preciso que elas consigam entender a importância de considerar todos os stakeholders envolvidos na operação dela, para que ela consiga perceber o que você pode fazer de inovador de verdade, que pode ser lucro, mas não só”.
O evento, totalmente conectado com as diversas realidades do Brasil, tem o objetivo de apontar aos participantes um norte realmente inovador. “E a gente consegue chegar nesse espaço quando um participante entra em uma sala do evento para assistir um conteúdo que ele não esperava, como um CEO assistindo um talk de um cientista sobre sustentabilidade. É só assim que eu consigo fazer com que esse cara perceba que isso faz parte da inovação dele também. Ele precisa considerar o ecossistema que ele vive, ou seja, o macro e micro Brasil, a região que ele está, o bairro que ele está, as pessoas, as famílias, o ambiente, com tudo. Porque só assim que a gente vai conseguir desenvolver inovações que realmente transformam”, afirma.
Para o futuro do evento, João espera que as próximas edições continuem a trazer para os participantes cada vez mais experiências e conexões, que são o que encanta quem chega ao sul de Minas para conferir o Hacktown. “Os impactos das conexões que acontecem nesses dias de evento podem transformar realidades, pessoas, projetos. Que as edições sejam cada vez maiores, mais surpreendentes e sempre em Santa Rita, que é nossa casa”.
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